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observatório ecopolítica

Ano V, n. 114, julho de 2022.

 

virada ODS em SP: governança e sustentabilidade

 

2015, tempo da ação global para as pessoas e o planeta. Sob esse slogan, em 25 de setembro de 2015, foram estabelecidos os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) na Assembleia Geral das Nações Unidas pela Resolução A/RES 70/1. Uma cartilha composta por 169 metas, compondo 17 objetivos a serem equacionados na chave da sustentabilidade planetária com vistas ao ano de 2030 foi assinada por todos os 193 Estados-membros da ONU.


A noção de desenvolvimento sustentável preconizada para o planeta por meio dessas metas busca a conservação do ambiente planetário para a manutenção do que definem como vida humana, na qual o crescimento econômico deverá acontecer conjuntamente com o desenvolvimento social, abrangendo a promoção de direitos, segurança e proteção do meio ambiente, entendido como suporte natural e, também, artificial em interação com a população.


A Agenda 2030 deu base para a primeira edição da Virada ODS, que ocorreu nos dias 8, 9 e 10 de julho de 2022, em vários pontos da cidade de São Paulo. Segundo seus organizadores, o maior e mais completo evento do planeta voltado para promover e destacar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas por meio de apresentações culturais, palestras, premiações e rodadas de negócios. O texto de apresentação do evento, destacou a importância do "engajamento cívico", e da tentativa de conscientização mais ampla da sociedade sobre os fatores necessários para o que define por "cidades mais justas".


O palco principal do evento foi no prédio da Bienal de São Paulo, no parque Ibirapuera, mas também ocorreram programações em 9 CEUs (Centros Educacionais Unificados) da rede municipal de ensino, em diferentes regiões da capital. Todos os locais contaram com atividades que giraram em torno de seis dos 17 ODS: Comunicação; Inovação e Tecnologia; Desenvolvimento Econômico; Justiça; Educação e Cultura.


Na abertura da Virada, o prefeito da atual gestão de São Paulo declarou que a capital está alicerçada em três pilares: sustentabilidade, desenvolvimento econômico e social, com foco nos mais vulneráveis. Além de ressaltar o comprometimento com a "Década de Ação", acordo iniciado no começo de 2020, após líderes globais, reunidos na Cúpula ODS, em setembro de 2019, em Nova York, estipularem um prazo de 10 anos para todos os países-membros da ONU cumprirem as 169 metas dos 17 ODS.


Meio ambiente, sustentabilidade, diversidade e inclusão foram os temas que permearam as palestras do evento e que contaram com a participação de lideranças políticas, influencers, empresários, representantes da sociedade civil, ativistas e políticos de vários países. O grupo de convidados se organizou em sete temas: mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável; smart cities e as cidades do futuro; saúde pós-Covid; igualdade de gênero; combate ao racismo; eficácia na conquista da paz e da justiça; combate à fome e à pobreza.


Dentre os principais palestrantes, estavam os ex-chefes de Estado Felipe Calderón, presidente do México entre 2006 e 2012; Juan Manuel Santos, vencedor do Nobel da Paz em 2016 e presidente da Colômbia entre 2010 e 2018; o atual prefeito da cidade de Londres, Sadiq Khan; a primeira deputada trans eleita no Chile, Emilia Schneider; e o oitavo Secretário-Geral das Nações Unidas, o sul-coreano Ban Ki-moon.


Ban Ki-moon, que durante sua gestão levou adiante os ODM (Objetivos do Milênio), declarou ser preciso uma conscientização da população brasileira quanto à preservação ambiental para que o país alcance os 17 ODS. Enfatizou a necessidade urgente de parar os desmatamentos na floresta Amazônica e da preservação da bacia hidrográfica do Rio Amazonas. Segundo o ex-Secretário-Geral da ONU, "a Amazônia representa a saúde do mundo", e se não houver mudanças quanto a sua preservação, as pessoas não poderão "respirar com segurança". Alcançar os ODS contribuirá para a possibilidade de "um futuro mais resiliente e próspero para todos", declarou.


Ban Ki-moon também destacou que o cumprimento das metas tem sido desigual pelo planeta e que a crise sanitária decorrente da chamada pandemia de Covid-19, desacelerou o progresso e foi a responsável pela reversão de algumas vitórias, com a intensificação de desigualdades, ao mesmo tempo em que as mudanças climáticas seguiram ocorrendo. "Precisamos de uma parceria global forte se queremos atingir os ODS. (...) Temos de agir agora para salvar o futuro da humanidade. (...) Não temos plano B, pois não temos um planeta B", declarou o diplomata.


Violência na floresta amazônica, desmatamento, consciência ambiental, sociedade, governança e sustentabilidade foram questões também presentes nas falas do ex-chefe de Estado Felipe Calderón e do xamã Yanomami Davi Kopenawa no Palco Mudanças Climáticas. Para o ex-presidente mexicano, o caminho para o futuro sustentável só poderá ser alcançado por meio de mensagens positivas, possíveis e pelo comprometimento dos cidadãos e empresas com o que consomem. "O medo não está funcionando, precisamos falar também sobre o paraíso climático que pode ser criado nesse caminho". Sua fala foi completada pelo líder Yanomami, que fez um apelo ao "povo das cidades" para apoiar os povos da floresta que, segundo ele, tem o papel mais relevante na garantia e preservação de um futuro sustentável.


A questão da sustentabilidade não é uma meta exclusiva dos Estados; ela está incorporada na conduta dos povos, etnias e minorias numéricas. As falas sinalizam para as devidas complementações necessárias entre a programática transnacional da ONU e a sociedade civil organizada, a ponto de a liderança indígena incorporar os preceitos da sustentabilidade, agora e para o futuro, que nada mais é do que a versão palatável do capitalismo na atualidade.


No último dia do evento, representantes da sociedade civil e empresários, enfatizaram as metas e contribuições definidas pela Agenda 2030 para promoção de uma cidade sustentável. A vice-presidente de um grupo bancário global, comentou sobre a preservação do meio ambiente da floresta amazônica e sobre a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), em 2003, como exemplo de chamado à participação do empresariado brasileiro para a discussão das diretrizes e formulações de políticas públicas no Brasil. "Esse é um fórum que deve haver para as empresas sentirem a participação no desenvolvimento da responsabilidade social. (...) O mercado, o 'ser' mercado, funciona muito a partir de resultados a curto prazo. E questões ambientais e sociais precisam ter um olhar mais adiante", declarou a vice-presidente executiva. É de pasmar aonde chega o "direito à idiotice", título de um derradeiro capítulo de um livro de um filósofo intempestivo, pois o mercado ganha ontologia e é alçado ao estatuto de 'ser'.


A Virada também contou com Rodas de Negócios com a participação de representantes ligados às áreas produtivas da cidade: economia verde e sustentabilidade; comércio e varejo; tecnologia e inovação; turismo e gastronomia; economia criativa, educação e qualificação; infraestrutura, mobilidade e construção; indústria, saúde, esporte e qualidade de vida e serviços financeiros e profissionais. A grande maioria foi formada por indígenas, imigrantes e refugiados, mulheres egressas do sistema prisional, negros e negras do Programa São Paulo Afroempreendedor.
A meta é fomentar o desenvolvimento econômico dos chamados vulneráveis, constituindo pessoas "produtivas" e "inovadoras", dispostas a criar um ambiente seguro, atrativo e, sobretudo, "sustentável". Está em jogo como absorver os chamados vulneráveis ao projeto desenvolvimentista em época de crise, desemprego, de perdas salariais e redução de benefícios.


Junto com a Virada, foi lançado pelo Instituto Cidades Sustentáveis, o Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades – IDSC, com uma metodologia de pesquisa que faz parte de uma série de relatórios produzidos pelaSustainable Development Solutions Network (SDSN) para monitorar a implementação dos 17 ODS nos países membros da ONU. Segundo seus idealizadores, o índice tem por objetivo estabelecer os ODS como ferramenta útil e efetiva para a fomentação de políticas públicas nos municípios brasileiros. Nesse contexto, o IDSC-BR utiliza um conjunto de indicadores especialmente adaptados para as prioridades das cidades brasileiras. Esta avaliação utiliza dados locais, produzidos no país, que normalmente não podem ser usados em avaliações internacionais.


Esse índice cumpre a função de monitorar tendências e orientar intervenções governamentais e de organizações internacionais, bem como da chamada sociedade civil, na medida em que são também produzidos em parcerias entre governos, agências internacionais e institutos universitários. Objetiva produzir moderação tanto do Estado e de suas instituições, quanto dos grupos políticos que atuam em meio à sociedade civil organizada. Abarca o dispositivo monitoramento que produz relatórios capazes de medir e mensurar ações como forma de monitorar as condutas, individuais ou institucionais, para acompanhamento e intervenção do fortalecimento do Estado, e, no caso do IDSC, do cumprimento dos ODS até 2030.


É a racionalidade neoliberal fazendo funcionar a parceria Estado-sociedade civil em função do desenvolvimento capitalista sustentável e de expansão das condutas resilientes, procurando conter eventuais confrontos na medida em que o lucro aumenta e a pobreza cresce. Sob a rubrica de vulneráveis estão todos aqueles que devem estar dispostos a encampar o empreendedorismo e conscientes que não há emprego nem manutenção de empregos e salários. Os sindicatos estão cada vez mais expostos como beneficiários nos negócios com os empresários e a burocracia do Estado. Isto chama-se governança, a maneira moderada de produzir modulações entre todos para que em nome de algo maior, o futuro melhor para as novas gerações, todos se satisfaçam com capitalismo e sua democracia representativa e participativa.


Entre os efeitos dos ODS estão as cidades inteligentes. A sua implementação já acontece. E seu aprimoramento é questão de tempo. Com a combinação de monitoramento sofisticado a ser habilitado e possível com a chegada do 5G em todo o planeta nos próximos anos, as cidades inteligentes já passaram da fase de teste. Um de seus laboratórios foram campos de refugiados, como o Kalobeyei, construído exclusivamente para aceitar alguns refugiados de outros campos no Quênia. Ali testou-se, com o financiamento de empresa transnacionais e ONGs, aplicativos de pagamentos por aproximação – hoje tão presentes nos cartões, relógios e celulares de qualquer um –, coleta de dados por meio do setor privado, como também pelas ONGs e pela administração do campo. Ou seja, uma coleta de dados infindável e operacionalizada pelo big data construindo um perfil de cada um tanto para saber quem é, o que faz, como pensa e o que é capaz de fazer no futuro próximo e distante.


Um monitoramento incessante em nome da capacitação de refugiados e sua inserção no mercado de trabalho. Uma articulação de empresas, agências, ONGs e ONU para construção de campos mais humanos, ou seja, uma gestão eficiente das vidas ali encarceradas para que se tornem aptas e satisfeitas em terem seus empregos e/ou empreenderem.


Somam-se a essas experiências as práticas de monitoramento na China que vão desde o controle do comportamento das pessoas dentro dos transportes públicos em Nanquin, como os testes de reconhecimento facial nos campos de concentração para os uigures, contabilizando entre 800 mil a 2 milhões de pessoas reconhecidas simultaneamente.
No mais, segue a implementação das cidades inteligentes e toda a sua gama de aplicações abrangendo hospitais, mobilidade urbana, meio ambiente, educação, gestão pública etc.. O imperativo é que todos se tornem smart. Sob o lema de ser "glocal", global combinado com o local, as cidades inteligentes não devem deixar qualquer vazio nesse fluxo de monitoramentos.


E qual a energia para compilação de tantos dados? As cidades inteligentes precisam de fontes de energias renováveis. É consenso que, para alcançar a cidade inteligente, humana e sustentável, é fundamental ter a energia nuclear. Enquanto isso, o Japão despeja no oceano a água utilizada para resfriar as usinas de Fukushima no acidente nuclear de 2011.

 

 

R A D. A. R

 

Virada ODS

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Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades - Brasil


 

 

 


O observatório ecopolítica é uma publicação quinzenal do nu-sol aberta a colaboradores. Resulta do Projeto Temático FAPESP – Ecopolítica: governamentalidade planetária, novas institucionalizações e resistências na sociedade de controle. Produz cartografias do governo do planeta a partir de quatro fluxos: meio ambiente, segurança, direitos e penalização a céu aberto. observa.ecopolitica@pucsp.br

 

 

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