observatório ecopolítica
     ano I, n. 6, março, 2016.
     
     
 
      
        terrorismo, antiterrorismo à brasileira.
        
        
        Enfim, depois de assessorada por todos os lados, incluindo câmara e senado, a presidente sancionou a lei 13.260, de 16 de março de 2016 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20152018/2016/Lei/L13260.htm#art19), apresentada pelo executivo em 18 de junho de 2015. O Brasil está em tensão política, deve receber os jogos Olímpicos em agosto, deve-se se mostrar ordeiro. Não foi muito difícil contornar as variadas pressões de movimentos sociais para a sua aprovação. No vaivém da lei, uma ex-guerrilheira a assina com vetos. 
        
       A lei regulamenta o artigo 5o. da Constituição de 1988 (“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”), inciso XLIII (“a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”) e justifica os devidos vetos (http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2015-2018/2016/Msg/VEP-85.htm).
        
        Trata-se de uma formalidade legal a serviço da segurança da propriedade e um alerta de orientação normativa às condutas dos movimentos sociais, segundo a esperada expectativa governamental (de situação e oposição) sobre manifestações moderadas que colaborem para a continuidade dos governos. 
        
        Se do lado da conservação do Estado está o uso  constitucional do impeachment, do  lado dos que contestam o Estado e os governos restava produzir uma lei para se legislar  sobre o que é impeditivo, perigoso, degenerado. Trata-se, portanto, e tão  somente, de uma normalização do normal para o contínuo e durável funcionamento dos governos (democráticos do momento ou  autoritários no futuro).
  Nessa perspectiva entende-se porque o projeto de lei seguiu  reto, e como assimilou e modificou as leituras do senado e da câmara para  chegar limpo aos vetos previsíveis do executivo.
  A lei antiterrorismo nada mais é que uma instrumentalidade necessária ao funcionamento do código penal. Numa época em que punir é a palavra-chave e a prática padrão em funcionamento, esta lei nada mais faz que repercutir punições peculiares, engrossando as tipificações no rol dos crimes hediondos, que teve um de seus baixos começos no Brasil em torno de jovens considerados infratores. Esta lei corrobora o que é inerente à linguagem penal, a estultice. Mas não só, repisa, corrobora e se supera em sua façanha tautológica, afinal, crime hediondo significa crime criminoso.
        
        
        Como se sabe e constata-se, a lei depende dos seus intérpretes técnicos, procedimentos e neutralidade da justiça. A aplicação  desta lei dependerá da política. E se não fosse assim não haveria política. 
               
               A lei, com suas inquestionáveis universalidade e aplicabilidade seletiva, funciona para fazer crer  no fim das ilegalidades, mas sem deixar de marcar a necessidade de se atualizar  perante os novos ilegalismos que ela mesma nutre e gere, com tolerância ou não,  dependendo das forças em jogo. No âmbito da razão neoliberal, trata-se de  governar os riscos. Ou seja, supor que sempre haverá ilegalismos passíveis de  serem legislados e que outros jamais serão definitivamente equacionados:  política!
               
  Necessita-se estabelecer o que é tolerável – a corrupção intrínseca  ao Estado se ajusta à atual prática da delação  premiada a incrimináveis que não são vistos como perigo para a sociedade – e manter o regime punitivo austero e  supostamente eficiente aos sujeitos identificados como perigo para a sociedade.
  
Qualquer um sabe muito bem discernir esses dois modos. E sabe também que o perigo para a sociedade e o Estado capitalista está em quem rouba e procura subverter o Estado (democrático ou não) de perpetuação da propriedade. Para isso há polícias, exércitos, agências de inteligência, diplomacias, direitos, leis, normas, partidos políticos, organizações empresariais e de movimentos sociais. Política! 
               
               Mas há também o que escapa, introduz o novo, recusa-se a ser  empreendedor de inovações à ordem e ao fluxo de capitais. Eles, sendo muitos ou  poucos, são a potência que atordoa a ordem, que a ameaça de nocaute, o que é  inevitável em qualquer luta. É redundante concluir que depois do nocaute pode advir  uma nova forma de luta contínua entre adversários que honram as suas éticas.
               
	    Mas na era dos pronunciamentos da boca para fora sobre  ética, as evasivas empresariais e políticas para a continuidade das lutas  espetacularizadas esperam cooperação para a normalização das condutas e, para  tal, a lei antiterrorismo somente repercute a situação conformista da maioria  no presente. 
              
	    Mas isso também não é novidade: para a representação encontrar estabilidade, exige-se que se aceite a  regra de consenso liberal do poder soberano e do sujeito de direito e a  neoliberal de convocação à participação e sua pletora de direitos minoritários.  Ambas se ajustam aos ideais de governo de  maioria (e não raras vezes esse se metamorfoseia em autoritarismos e  totalitarismos).
             
 Então, uma ex-guerrilheira pode sim sancionar a lei, assim como os movimentos sociais moderados nela encontrarão refúgios para as radicalidades em seu interior. Enquanto isso os empresários ficam mais solidários e os fascistas tagarelam.
     R A D.A.R
     Leis antiterreroristas pelo planeta:
    
     
   		EUA
     Patrioct Act 
     https://www.gpo.gov/fdsys/pkg/PLAW-107publ56/pdf/PLAW-107publ56.pdf 
     Freedom Act 2015
     https://www.congress.gov/114/bills/hr2048/BILLS-114hr2048enr.pdf 
     
     Canadá (2015)
       
        https://www.canada.ca/en/campaign/antiterrorism.html
        
China (2015)
      http://news.xinhuanet.com/english/2015-12/27/c_134956054.htm
 
       http://chinalawtranslate.com/%E5%8F%8D%E6%81%90%E6%80%96%E4%B8%BB%E4%B9%89%E6%B3%95-%EF%BC%882015%EF%BC%89/?lang=en 
       Filipinas
       http://www.congress.gov.ph/download/ra_13/RA09372.pdf  
     
       União Europeia 
       https://dre.tretas.org/dre/1008160/
     
     Paquistão 
       http://www.satp.org/satporgtp/countries/pakistan/document/actsandordinences/anti_terrorism.htm 
     
     Japão 
       http://japan.kantei.go.jp/policy/2001/anti-terrorism/1029terohougaiyou_e.html
       
     
       
      
     terrorismo à americana
     
       Dentre  os nomes dos 10 terroristas mais procurados pelo FBI hoje estão: oito homens  acusados de envolvimento com o que nomeiam de “grupos terroristas  fundamentalistas islâmicos”, um homem acusado de ser associado a grupos  “extremistas pelos direitos dos animais” e uma mulher acusada de assassinato e  vínculo ao Black Liberation Army. 
  Em janeiro deste ano, o FBI divulgou um guia de prevenção ao que eles denominam “violências extremistas” nas escolas, o “Preventing Violent Extremism in Schools”. O guia é destinado a pais e professores e busca promover a identificação de jovens suspeitos de serem ou se tornarem adeptos de grupos extremistas. O guia propõe “modelos comportamentais” de educação e tem como principal meta “construir escolas resilientes por meio da promoção do bem-estar social e psicológico de seus estudantes”.
     
       O guia  vem acompanhado de um “material educacional” dividido em áreas para crianças e  jovens, líderes e adultos confiáveis, e pais e comunidade, disponibilizado no  site do FBI. “Don’t Be a Puppet: Pull Back the Curtain on Violent Extremism”  (Não seja marionete: abaixe as cortinas sobre a violência extremista) é um site  interativo com interface e design de game que pretende educar sobre os tipos de  terrorismo, como identificá-los, quando constituem uma ameaça – há uma nota em  que a instituição alerta para o fato de que a “crença em ideologias extremistas”  não é em si um crime, e que se torna um problema quando a pessoa começa a  planejar praticar atos avaliados como violentos –, e como devem ser  denunciados. 
 A maior parte da lista de comportamentos elencados como suspeitos e que devem ser denunciados está relacionada ao meio virtual, a como e a quais sites e aplicativos o suspeito usa, e ao conteúdo do que ele posta nas redes sociais. Pretende-se combater esses grupos de modo compartilhado, como relata o documento, conectando escola para investir em resiliência e denuncia, game online educativo e polícia.
     
       Os EUA  dividem os terrorismos entre o internacional, focado em “organizações  terroristas estrangeiras”, e o doméstico, focado em “movimentos extremistas”.
  Na seção  interativa de terrorismo internacional estão listadas e descritas seis  organizações: Al Qaeda, Al Shabaab, Hizballah, ISIL/ISIS, Kahane Chai, e Farcs.  Localizados pelo FBI nas regiões: Arábia (assim, em geral), Somália, Líbano  (com destaque para “apoio local a grupos palestinos contrários ao Estado de  Israel”), Iraque e Síria, Israel, e Colômbia.
  Na seção  interativa de terrorismo doméstico estão: 
 •	Sovereign Citizen Extremists, o que podemos traduzir como praticantes da desobediência civil, aqueles que “acreditam serem separados ‘soberanos’ em relação aos Estados Unidos da América. Eles pensam que não devem responder a qualquer autoridade governamental.” O próprio texto descritivo enfatiza que, em geral, seus crimes são classificáveis como fraude e não-violentos. 
       
      •	Abortion Extremists, grupo que reúne pessoas contrárias e favoráveis à prática do aborto que utilizam meios considerados violentos, desde o ataque e destruição de propriedades como clínicas abortivas e falsas clínicas abortivas, até o assassinato de pessoas que realizam abortos, por exemplo. 
        
 •	Animal Rights Extremists and Environmental Extremists, chamados “ecoterroristas”, mesmo que “estes extremistas violentos usualmente não procurem matar ou ferir pessoas, seus crimes – nos quais se inclui violação de propriedade, vandalismo, ameaças, ataques cibernéticos, incêndios culposos e lançamento de bombas – causaram danos de milhões de dólares e interromperam a vida de muitos americanos.” Vale ressaltar: são identificados como uma grande ameaça nos EUA. Poucos meses antes do ataque às Torres Gêmeas, em 2001, o FBI havia classificado a Earth Liberation Front como a maior ameaça de “terrorismo doméstico” do país, ao lado da Animal Liberation Front.  
       
  •	Militia Extremists, patriotas que se juntam em situações emergenciais, e que criticam o governo por considerá-lo corrupto e incapaz de proteger o país de possíveis danos. 
       
   •	Anarchist Extremists, “Anarquistas extremistas acreditam que a sociedade não deveria ter governo, leis, nem polícia, e eles são pouco organizados, não possuem lideranças centrais. Os anarquistas extremistas violentos acreditam que tal sociedade [anarquista] só pode ser criada por meio da força. Quem ou quais são seus alvos: Os anarquistas extremistas violentos usualmente atacam símbolos do capitalismo, que eles acreditam serem a causa de todos os problemas da sociedade – como as grandes corporações, organizações governamentais, e agências policiais. Eles violam propriedades, causam motins, lançam bombas e em alguns casos, feriram policiais.” 
        
     •	White Supremacy Extremists, conhecidos, também no Brasil, como White Power, são considerados uma ameaça por terem como alvos minorias étnicas, raciais e religiosas, e também o governo federal. 
        
        O alerta  para o discurso de quem pode vir a se tornar um extremista está vinculado a  palavras-chave como: Nações ocidentais  corruptas; Nós devemos contra-atacar; Raça superior; Desconfiança no governo; Destruição  do meio ambiente.
  A  ameaça, diferente do que alardeiam, sequer está localizada no risco de  violência. Muitos dos grupos extremistas perseguidos pelo FBI não atacam  pessoas. O FBI define como ato de extrema violência o ataque à propriedade e,  até mesmo, a recusa em servir ao governo e o boicote ao pagamento de impostos,  por exemplo. 
  A ameaça  está localizada naqueles que não são moderados e não têm uma conduta  devidamente democrática e tolerante com o fundamentalismo pacífico. Importa é  combater como “extremismo” tudo o que estiver apartado de sua imediata conexão  às instituições. 
       

 
    
       
      
     
     O observatório ecopolítica é uma publicação quinzenal do nu-sol aberta a colaboradores. Resulta do Projeto Temático FAPESP – Ecopolítica: governamentalidade planetária, novas institucionalizações e resistências na sociedade de controle. Produz cartografias do governo do planeta a partir de quatro fluxos: meio ambiente, segurança, direitos e penalização a céu aberto. observa.ecopolitica@pucsp.br
	 
     
		
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