observatório ecopolítica
Ano V, n. 97-98, setembro de 2021.
OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.
ANÁLISES, 5ª. parte: ODS 7,9 e 14
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 7: energia limpa e acessível.
"Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos" configura o sétimo Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecido pela ONU em parceria com governos, organizações sociais e privadas, para o ano de 2030.
As três metas que compõem este objetivo são:
1. assegurar o acesso universal, confiável, moderno e a preços acessíveis a serviços de energia;
2. aumentar substancialmente a participação de energias renováveis na matriz energética global;
3. dobrar a taxa global de melhoria da eficiência energética;
a. reforçar a cooperação internacional para facilitar o acesso à pesquisa e às tecnologias de energia limpa, incluindo energias renováveis, eficiência energética e tecnologias de combustíveis fósseis avançadas e mais limpas, e promover o investimento em infraestrutura de energia e em tecnologias de energia limpa;
b. expandir a infraestrutura e modernizar a tecnologia para o fornecimento de serviços de energia modernos e sustentáveis para todos nos países em desenvolvimento, particularmente nos países menos desenvolvidos, nos pequenos Estados insulares em desenvolvimento e nos países em desenvolvimento sem litoral, de acordo com seus respectivos programas de apoio.
Os complementos (3a e 3b) foram inseridos posteriormente, após críticas de que os ODS poderiam não ser bem-sucedidos, por serem muito vagos.
Energia limpa está relacionada a energias produzidas a partir das chamadas fontes renováveis (tais como energia térmica da terra, energia do sol, vento, biomassa, rio, marés e ondas), que não produzam CO2 ou outros poluentes, e sejam eficientes em seu uso.
Enquanto no contexto global, o acesso da população à energia elétrica passou de 78% em 2010, para 90% em 2019, o grande problema de distribuição de energia elétrica se encontra na África subsaariana. Nesta região, 25% da população tinha acesso à energia elétrica em 2010; em 2019, passou para 46%. Entretanto, estes dados se referem à energia de modo geral e não à chamada energia limpa.
Na América do Sul, o acesso geral à energia elétrica, em 2019, era maior que 98%. No continente, grande parte dos países alcançaram 100% de acesso à energia. As exceções são: Guiana, 92%; Peru, 98%; Bolívia, 96%; Suriname, 98% (não constam os dados da Guiana Francesa em 2019).
Em relação ao uso de energias renováveis, em 2017, apenas o Uruguai e o Paraguai utilizavam mais de 50% (aproximadamente 60%), e em terceiro lugar o Brasil, com aproximadamente 45%.
As principais fontes de energia renovável no sul do continente americano são as fontes hídricas (como as hidrelétricas) e bioenergéticas (como o uso do etanol).
Apesar de terem sido lançados em 2015, os ODS vinham sendo preparados como substitutos dos Objetivos do Milênio (ODM). Um dos primeiros "esboços" com 17 ODSs foi lançado durante a Rio+20, em 2012. A ONU proclamou esse ano como o "Ano Internacional da Energia Sustentável para Todos". No ano anterior, em 2011, a ONU inaugurou o Programa "Sustainable Energy for All", cujas metas correspondiam às três primeiras que compõem atualmente o ODS 7.
Assumindo que o fator energético é o principal responsável pela emissão de Gases do Efeito Estufa (GEE), a proposta era investir em energias alternativas como uma oportunidade para novos negócios, crescimento econômico, geração de empregos, etc.
No primeiro fórum sobre o tema, em 2014, foi declarada a Década da Energia Sustentável para Todos (2014-2024), anunciou-se também que governos e setores privados duplicariam o financiamento em energias renováveis.
Atualmente a América do Sul produz quase 10% de toda energia renovável no planeta, em grande parte pelo alto investimento em hidrelétricas, sendo o Brasil o principal gerador deste tipo de energia. Mas, além da energia hídrica, cresce também na região o investimento em outras formas de energia renovável, como a energia eólica e solar.
Em paralelo ao investimento em novas fontes de energia, surgem cada vez mais empresas que vendem Créditos de Energia Renovável (RECs) ou Créditos de Carbono, prometendo "zerar" as emissões de Gases de Efeito Estufa.
Em 2017, o Governo Federal instituiu o RenovaBio (Política Nacional de Biocombustíveis), pela lei 13.576 de 2017, cuja meta é reduzir a emissão de GEE e cumprir com o Acordo de Paris, por meio de certificações e da comercialização de créditos (Cbio).
De acordo com o site da Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis no Ministério de Minas e Energias, o programa possui três eixos estratégicos: 1) Metas de Descarbonização, que diz respeito às metas que distribuidoras de combustíveis devem cumprir para os próximos 10 anos; 2) Certificação da Produção de Biocombustíveis, que se refere às certificações voluntárias em que os produtores recebem notas de eficiência energético-ambiental; e 3) Crédito de Descarbonização (Cbio), criados a partir da multiplicação das notas pelo volume de biocombustível comercializado, e que poderão ser vendidos.
Diversifica-se o mercado, diversificam-se as moedas, diversificam-se os negócios e anuncia-se um aumento no consumo de energia como resultado da crescente "qualidade de vida", visando um futuro garantido e cheio de oportunidades. É a sustentabilidade que vem salvar o capitalismo.
R A D. A. R
ONU – Desenvolvimento Sustentável: Energia
Monitoramento do ODS 7
International Renewable Energy Agency – Statistics Profile
O que fazer para termos "energia sustentável para todos"
Programa Sustainable Energy for All
ONU lança Década de Energia Sustentável para Todos
Plan de Acción Regional: Acelerando el Despliegue de Energía Renovable en América Latina
Lei nº 13.576, de 26 de dezembro de 2017
Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável
RenovaBio
https://www.gov.br/anp/pt-br/assuntos/renovabio
http://antigo.mme.gov.br
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 9: indústria, inovação e infraestrutura.
ODS 9 e o Projeto 15-Microsoft.
ODS 9: Construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação.
Um dos maiores investidores/parceiros para a América Latina a se alinhar ao desenvolvimento sustentável foi a Microsoft, que também possui uma aliança de longa data com a ONU.
A tecnologia computo-informacional é compreendida pela empresa tanto como a solução para o mercado como também para atingir os objetivos do desenvolvimento sustentável como um todo.
Como parte de uma parceria entre o PNUD e a Microsoft para promover o uso eficaz de tecnologias digitais para alcançar os ODS, o Programa de Pequenos Subsídios, financiado pelo Fundo Global do Meio Ambiente, está aliado com o Projeto 15 da Microsoft para abordar o meio ambiente global.
O Projeto 15 da Microsoft objetiva aplicar tecnologia digital para acelerar a inovação de propriedade da comunidade em nível local.
Foi assim que o Programa de Pequenos Subsídios iniciou a colaboração em dois países-piloto na África com foco na conservação de espécies e biodiversidade. Hoje em dia, o programa se amplia para mais países com a finalidade de implementar ações locais categorizadas como inovadoras e relacionadas a cidades sustentáveis, agricultura, pesca e a outros dos chamados problemas ambientais emergentes.
O Projeto 15 da Microsoft investe em Internet das Coisas, Inteligência Artificial e tecnologias de nuvem destinadas aos parceiros do Fundo Global do Meio Ambiente. Pretende aprimorar o trabalho dos projetos, automatizando processos manuais, ou seja, dinamizar a coleta, o processamento, a análise e o monitoramento de dados.
Segundo Sarah Maston, a fundadora do Projeto 15, especialista técnica sênior e arquiteta de soluções da Microsoft: "O Projeto 15 da Microsoft é sobre a construção de uma ponte entre a comunidade científica e a comunidade técnica. As soluções tecnológicas criadas para outros problemas podem ser reinventadas e aplicadas para tratar de questões de conservação e outros desafios críticos".
O Projeto 15 utiliza o Azure e uma incubadora (Hub) de Inteligência Artificial. Assim, os dados são coletados com o auxílio da Inteligência Artificial, passam para a nuvem em que são analisados os eventos por meio dessa inteligência. Em seguida, são processados com o software Azure que distribui as informações em outros softwares que poderão ser visualizados por usuários. Desse modo, os dados são coletados e analisados para então fomentar outras bases de dados que envolvem desde aplicativos web até sua apresentação em softwares de business inteligence.
Entretanto, esse processo de análise dos dados por alguém é opcional. O Azure também possui machine learning, ou seja, uma área da Inteligência Artificial em que o objetivo é desenvolver técnicas computacionais sobre o processo de aprendizado.
Os testes são realizados desde 2020 com projetos-piloto.
Entre a América Central e a América do Sul está o Panamá. Ali, a organização Yaguara está filiada ao Programa de Pequenos Subsídios e usa tecnologia do Projeto 15 em processos habilitados para nuvem para monitoramento e notificações de onças, bem como prevenir e rastrear conflitos entre seres humanos e animais selvagens.
Como as pessoas do projeto passam menos tempo coletando e processando dados, podem coletar mais dados não somente das onças-pintadas da região, mas de toda a comunidade, humana e de outros animais silvestres. Articula-se, por meio do processamento de dados, o monitoramento de qualquer vida.
Nesse projeto, atualmente, está em andamento a discussão para gamificar o monitoramento do animal usando um aplicativo semelhante ao de um jogo. Portanto, assim como as tecnologias computo-informacionais de guerra já usam layouts semelhantes ao de jogos, a Microsoft também as utiliza para salvar o mundo.
Mais ao Sul, na Colômbia, o Projeto 15 atua no projeto "Guardiões da Amazônia", em que mulheres indígenas são instruídas a como preservar a parte da Amazônia que está no seu país. Ao todo são 2.500 mulheres indígenas instruídas para se tornarem líderes aprendendo tanto sobre conservação como também sobre governança. Tanto os dados geofísicos da região como dos povos indígenas são processados no Projeto 15.
Apesar do Projeto 15 estar se espalhando pelo planeta, o seu laboratório foi sediado na África. O número 15 refere-se ao assassinato de elefantes no continente: a cada 15 minutos um deles morre.
Ali, o Projeto 15 utiliza drones com Inteligência Artificial para fazer o mapeamento de grandes áreas identificando os animais e as pessoas. Os drones ainda usam placas de energia solar para não terem de voltar a uma base para serem recarregados e conseguirem cobrir uma área cada vez maior.
De acordo com o Projeto 15, os dados são analisados para o desenvolvimento econômico e social do continente.
O Projeto 15 e a tecnologia de Inteligência Artificial Azure da Microsoft são aliados fundamentais para o processamento dos dados coletados das populações, da fauna e da flora das regiões em que o "Programa de Pequenos Subsídios" é aplicado.
A tecnologia Azure está em aprimoramento com os testes realizados pelo planeta. Agora, ela passou a ser utilizada no desenvolvimento de prédios nos Emirados Árabes para que economizem mais energia pela empresa Bee'ah. Além da empresa, a Azure também é utilizada em estudos sobre a mudança da criosfera das geleiras do Ártico. Para isso são usados dados óticos de drones e de satélites.
A Azure também é utilizada pela empresa Terrafuse na tentativa de prever os próximos eventos climáticos no planeta.
Enquanto isso, o "Programa de Pequenos Subsídios" atua em 127 países. Segundo este programa, a natureza e as crises climáticas exigem iniciativas ousadas, inovadoras e aceleradas que podem ampliar essas ações locais para se obter um impacto global. Neste contexto, a coleta, a análise e a partilha de dados relevantes são fundamentais para o sucesso do empreendimento, uma vez que permitem às comunidades locais compreender melhor os desafios que enfrentam, apresentar as soluções mais eficazes e aumentar a eficiência.
A vida, a natureza, e o que está na Terra deve se tornar um dado capaz de ser mensurado, controlado e ser passível de investimento para ser mais eficiente na preservação do planeta.
R A D. A. R
ODS 9
SGP
Project 15
Terrafuse AI
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14: vida subaquática: conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável.
A conservação da vida nos ecossistemas oceânicos tornou-se um objetivo específico na Agenda 2030. Na Cúpula do Milênio da ONU, cujas metas vigoraram até 2015, os oceanos sequer mereceram uma citação explícita nas três metas do único objetivo do milênio referente à sustentabilidade (OM 7- Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente, metas para garantir a sustentabilidade ambiental).
Os estudos e ações para a consecução do OM 7 acabaram encontrando dois graves problemas envolvendo os oceanos. Para realizar a meta 1 do OM 7, referente ao uso sustentável de recursos naturais, identificou-se que a sobrepesca (pesca predatória) estava significativamente reduzindo os estoques pesqueiros do planeta com consequente redução dos lucros do setor. Além da pesca, outras atividades econômicas envolvendo direta ou indiretamente uso dos recursos oceânicos estariam contribuindo para irreversíveis alterações nos ecossistemas marinhos. Em relação à meta 2, proteção à biodiversidade, observou-se a ausência de áreas marinhas protegidas no planeta: apenas 0,25% em áreas de alto-mar (fora de jurisdição nacional) e 8,4% em zonas costeiras.
O arrazoado da ONU sobre o destaque dado aos oceanos na Agenda 2030 considerou, simultaneamente, a biodiversidade e a economia marinha. Apontou para a existência de pelo menos 200.000 espécies marinhas identificadas pela ciência e calculou-se cerca de três bilhões de pessoas dependentes dos recursos do mar para seu sustento em uma economia que tem movimentado anualmente cerca de US $ 3 trilhões.
A pesca emprega em torno de 200 milhões de pessoas. Além disso, para reafirmar a importância do tema reiterou-se no arrazoado que 71% da superfície da Terra é coberta por oceanos e que estes contêm 97% da água do planeta. Também, destacou-se o fato de que os mares absorvem cerca de 30% do dióxido de carbono (CO2) produzido por atividades humanas. A partir daí foram identificados, além da pesca predatória, outros relevantes problemas enfrentados pelos ecossistemas marinhos: o aumento dos níveis de acidez nos oceanos abertos em 26% desde o início da Revolução Industrial, decorrente da citada absorção de CO2; o aumento da eutrofização, da redução da vida marinha e da deterioração da qualidade da água, especialmente nas zonas costeiras, acarretada pela poluição vinda dos continentes, na maioria das vezes por meio do sistema hídrico.
Com base nesses diagnósticos gerais, dez metas foram incluídas no objetivo sustentável 14, Vida subaquática: conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável.
Na Agenda 2030, as metas de cada ODS são classificadas em finalísticas e de implementação. As finalísticas são aquelas cujo objeto relaciona-se direta e imediatamente para o alcance do ODS. As metas de implementação "referem-se a recursos humanos, financeiros, tecnológicos e de governança (arranjo institucional e ferramentas: legislação, planos, políticas públicas, programas) necessários para a consecução das metas".
A partir da assinatura da Agenda 2030 pelo Brasil, o governo iniciou atividades de disseminação, internalização e interiorização dos objetivos sustentáveis, envolvendo integrantes da sociedade civil (ONGs, setores produtivos, instituições de ensino e pesquisa), dos governos municipais, estaduais e distritais, articulados e coordenados pela recém-criada Comissão Nacional para os Objetivos Sustentáveis — CNODS. Coube ao IPEA subsidiar propostas detalhadas de adequação das metas e de construção dos indicadores nacionais para alcançar os ODSs, atividade concluída e publicada no final de 2018.
Com a dissolução da CNODS em 2019, a implementação da Agenda 2030 seguiu pulverizada pelas instâncias que já tinham sido envolvidas desde o início do processo. A internalização do ODS14 foi acompanhada desde o início pela Comissão Interministerial para os Recursos do Mar — CIRM, órgão criado em 1974, dentro da Marinha do Brasil, e assessorada pela Secretaria do CIRM. Em 2020, a CIRM criou o Grupo Técnico Objetivo do Desenvolvimento Sustentável ODS14, inserido no Plano Setorial para os Recursos do Mar.
No caso da ODS14 é preciso considerar a extensão da jurisdição brasileira sobre parte do oceano Atlântico, que soma 3,6 milhões de km2, área equivalente à da região amazônica, sendo esse um dos motivos do território marítimo brasileiro ser nomeado também de Amazônia Azul.
Há três zonas principais, que se sobrepõem em algumas áreas: a Zona Costeira - faixa litorânea, incluindo uma parte terrestre, cuja linha se estende por 8.698 km, considerando recortes e reentrâncias da costa, com uma área de aproximadamente 514 mil quilômetros quadrados, abrangendo 17 unidades da federação; o Mar Territorial, faixa marítima com largura de 12 milhas náuticas (22 Km) a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular, e que, junto com uma faixa contígua também de 12 milhas, estão sujeitos à soberania brasileira; a Zona Econômica Exclusiva (ZEE) — uma faixa que se estende das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir da linha da largura do mar territorial. A ZEE tem direitos de soberania para exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais das águas, do leito do mar e seu subsolo, para investigação científica marinha, bem como a construção, operação e uso de todos os tipos de ilhas artificiais e estruturas.
Há ainda a questão da plataforma continental — o leito e o subsolo submarinos até a borda da margem continental, que pode avançar até 350 milhas náuticas da costa, segundo a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar — CNUDM. Nesse sentido, o Brasil pleiteou junto à Organização das Nações Unidas um acréscimo à área marítima brasileira de aproximadamente 3 milhões de km², pois seriam locais onde a plataforma continental do país se estende além das 200 milhas náuticas. Por enquanto, foi obtida a inclusão de 900 mil km².
Na América do Sul, além do Brasil, a Argentina, o Chile e a Guiana Francesa contam com ZEE de 200 milhas.
As metas do ODS 14 são citadas integralmente conforme o documento original da ONU nos trechos em itálico, e acompanhadas de alguns comentários e das recomendações para a construção de indicadores, feitas pelo IPEA e, em três casos, da alteração da meta em função das características do Brasil.
1. Até 2025, prevenir e reduzir significativamente a poluição marinha de todos os tipos, especialmente a advinda de atividades terrestres, incluindo detritos e a poluição por nutrientes.
Meta finalística. Dois indicadores a serem construídos e monitorados se destacam: o nível de eutrofização e a densidade dos resíduos plásticos flutuantes. No sistema de monitoramento deverão constar os índices da demanda bioquímica de oxigênio (DBO) — um indicador da poluição da água—, além de uma medida padronizada da densidade do material plástico no mar e do nível de matéria orgânica em suspensão no ambiente marinho, com foco nas áreas poluídas pelo lançamento de esgotos urbanos e industriais, e na aquicultura. Em relação às medidas para reduzir a poluição, foi criado recentemente pelo Ministério do Meio Ambiente o Programa de Combate ao Lixo no Mar com foco da zona costeira. No entanto não há referência acerca da articulação desse Plano com a Agenda 2030.
2. Até 2020, gerir e proteger de forma sustentável os ecossistemas marinhos e costeiros para evitar impactos adversos significativos, inclusive por meio do reforço da sua resiliência, e tomar medidas para a sua restauração a fim de assegurar oceanos saudáveis e produtivos.
Meta de implementação. O indicador a ser construído consiste em identificar o percentual da caracterização da zona econômica exclusiva brasileira baseada em estudos dos ecossistemas marinhos. A zona econômica exclusiva do Brasil se estende por 200 milhas (321,9 km) perpendiculares a partir da linha costeira. Não há, porém, um sistema de monitoramento referente a este indicador.
3. Minimizar e enfrentar os impactos da acidificação dos oceanos, inclusive por meio do reforço da cooperação científica em todos os níveis.
Meta de implementação. Dois indicadores foram propostos. O primeiro se refere à medição dos índices de acidez (PH) marinha média, atividade a ser ainda desenvolvida no Brasil. Outro indicador se refere ao percentual de recifes de corais saudáveis e já conta com dados pontuais baseados em programa do ICMBio sobre os corais, estabelecido em 2002.
4. Até 2020, regulamentar efetivamente a coleta no mar e acabar com a sobrepesca, com a pesca ilegal, não reportada e não regulamentada e com as práticas pesqueiras destrutivas; implementar planos de gestão com base científica para restaurar populações de peixes no menor tempo possível, pelo menos a níveis que possam, conforme suas características biológicas, produzir rendimento máximo sustentável.
Meta de Implementação. O indicador de referência consiste no percentual dos estoques pesqueiros dentro de níveis sustentáveis. O Brasil interrompeu a produção de estatísticas pesqueiras em 2011 e há recomendação para a retomada dessas pesquisas. Em 2020, a ONG Oceana realizou um estudo amplo sobre estoques pesqueiros e gestão da atividade. Não há, porém, referência ao ODS14.
5. Até 2020, conservar pelo menos 10% das zonas costeiras e marinhas, de acordo com a legislação nacional e internacional, com base na melhor informação científica disponível.
Adequação da meta ao Brasil: "Até 2020, conservar pelo menos 25% das zonas costeiras e marinhas, principalmente áreas de especial importância para a biodiversidade e serviços ecossistêmicos, assegurada e respeitada a demarcação, regularização e a gestão efetiva e equitativa, visando garantir a interligação, integração e representação ecológica em paisagens marinhas mais amplas, de acordo com a legislação nacional e internacional, e com base na melhor informação científica disponível."
Meta Finalística. O indicador consiste no percentual da área das unidades de conservação costeiras, avaliado conforme metodologia de monitoramento de sua efetividade.
6. Até 2020, proibir formas de subsídios à pesca que contribuem para a sobrecapacidade e a sobrepesca, eliminar os subsídios que contribuam para a pesca ilegal, não reportada e não regulamentada, e abster-se de introduzir subsídios como tais, reconhecendo que o tratamento especial e diferenciado adequado e eficaz para os países em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos deve ser parte integrante da negociação sobre subsídios à pesca da Organização Mundial do Comércio.
Adequação da meta ao Brasil: Até 2020, avaliar certas formas de subsídios à pesca, que contribuem para a sobrecapacidade e a sobrepesca, considerando a eliminação dos subsídios que contribuam para a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN), e abstendo-se de introduzir novos subsídios como estes, reconhecendo que o tratamento especial e diferenciado adequado e eficaz para os países em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos deve ser parte integrante da negociação sobre subsídios à pesca da OMC.
Meta finalística. O indicador estabelecido pela ONU seria o grau de implementação dos instrumentos destinados a combater a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (pesca INN). No entanto, o indicador foi considerado inadequado, e desse modo foram propostos índices focados na avaliação dos subsídios direcionados para a recuperação de estoques de espécies alvos da sobrepesca, assim como os incentivos direcionados à expansão da pesca sobre espécies inexploradas ou subutilizadas. Além disso, foi proposta a revisão dos subsídios existentes para assim, se evitar a pesca INN.
7. Até 2030, aumentar os benefícios econômicos para os pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos, a partir do uso sustentável dos recursos marinhos, inclusive por meio de uma gestão sustentável da pesca, aquicultura e turismo.
Adequação da meta ao Brasil: até 2030, aumentar os benefícios econômicos para todos os países, em especial os pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos, a partir da gestão sustentável dos recursos marinhos, inclusive a pesca, aquicultura e turismo.
Meta de implementação. O indicador global consiste em medir o percentual da pesca sustentável no PIB dos países. No entanto, é necessário definir o que é "pesca sustentável" para efetivação do cálculo. Além disso, essa mensuração depende da operacionalização do sistema de monitoramento mencionado na meta 4.
a. Aumentar o conhecimento científico, desenvolver capacidades de pesquisa e transferir tecnologia marinha, tendo em conta os critérios e orientações sobre a Transferência de Tecnologia Marinha da Comissão Oceanográfica Intergovernamental, a fim de melhorar a saúde dos oceanos e aumentar a contribuição da biodiversidade marinha para os países em desenvolvimento, em particular os pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos.
Meta de implementação. O indicador consiste no percentual do total do orçamento alocado para pesquisa na área de ciência e tecnologia marinhas.
b. Proporcionar o acesso dos pescadores artesanais de pequena escala aos recursos marinhos e aos mercados.
Meta de implementação. O indicador global consiste no grau de aplicação de um quadro regulador institucional que reconheça e proteja os direitos de acesso à pesca artesanal.
c. Assegurar a conservação e o uso sustentável dos oceanos e seus recursos pela implementação do direito internacional, como refletido na United Nations Convention on the Law of the Sea –UNCLOS [Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar CNUDM], que provê o arcabouço legal para a conservação e utilização sustentável dos oceanos e dos seus recursos, conforme registrado no parágrafo 158 do "Futuro Que Queremos".
Meta de implementação. O indicador consiste em avaliar os países que estão avançando na ratificação e implementação de instrumentos jurídicos e políticos relacionados ao direito internacional sobre os oceanos, tal como a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, visando a conservação e uso sustentável dos recursos marinhos. Essa meta sugere uma mensuração externa aos países signatários da Agenda 2030. Nesse sentido, o IPEA propõe o acompanhamento de marcos regulatórios nacionais de manejo sustentável de ecossistemas marinhos.
Observa-se o predomínio das metas de implementação, no total de sete, sobre as metas finalísticas, tendência que se repete nos demais objetivos, demonstrando que o objetivo principal da Agenda 2030 é o aprimoramento da governança planetária.
Na Agenda 2030, o ODS14, segundo o relatório do IPEA, é um dos objetivos com menor quantidade de indicadores globais já desenvolvidos. Apenas dois já têm metodologia e dados suficientes para gerar os resultados (referentes às metas 4 e 5), quatro têm a metodologia (referentes às metas 3, 6, 14.a e 14.b), mas ainda não dispõem de dados, e os demais precisam ser elaborados.
No Brasil, até agora, cumpriu-se integralmente apenas a meta 5, referente à cobertura de áreas marinhas protegidas em relação ao total da área marinha sob jurisdição nacional. Em 2018, foram criados dois mosaicos de unidades de conservação federais em ilhas oceânicas brasileiras — Áreas de Proteção Ambiental — APAs São Pedro e São Paulo (PE) e Trindade e Martim Vaz (ES) —, levando a conservação das zonas costeiras e marinhas do país em um patamar de 25%, superando, portanto, a meta de 10% da ONU. Além dessas UCs, já havia a APA Costa das Algas (ES) e Refúgio de Vida Silvestre de Santa Cruz (ES), a Reserva Biológica Santa Isabel (SE), a APA de Piaçabuçu (AL), o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (PE), o Parque Nacional Marinho de Abrolhos e Reserva Biológica de Comboios (ES).
Em 2021, foi lançada no Brasil a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030), proposta pela ONU para "conscientizar a população em todo o mundo sobre a importância do oceano" e incentivar ações urgentes e necessárias para o uso e proteção do espaço costeiro e marinho. O slogan dessa iniciativa é "a ciência que precisamos para o oceano que queremos". O planejamento das ações para a Década é coordenado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações — MCTI, representante científico da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da UNESCO. Formou-se o Comitê da Década Oceânica no Brasil para elaborar o Plano de Implementação, "com participação ativa da Marinha do Brasil, cujas ações esperam ser decisivas para o cumprimento da Agenda 2030, especialmente o ODS 14".
A consideração tardia da importância dos ecossistemas marinhos em uma agenda sustentável planetária não significa que o tema fora totalmente negligenciado até então. O uso de recursos marinhos e o transporte pelos oceanos, especialmente a partir do período mercantil, em torno do século XVI, acarretaram conflitos e guerras entre nações, disputas entre companhias comerciais, e exigiram tratados e acordos sobre o uso dos mares para que as trocas econômicas otimizassem a acumulação de riquezas. As águas não possibilitavam delimitação de fronteiras, cada navio devia cuidar e defender os interesses da bandeira tremulando em seu mastro. Os conflitos se equacionavam pelas armas, por alguma legislação estabelecida entre as nações e por regras de conduta de almirantes navais.
Em relação aos recursos da vida marinha, a pesca e a caça aos grandes mamíferos marinhos pareciam contar com estoques quase infinitos. No entanto, a extração pesqueira dependia de muito esforço humano e equipamentos adequados e na perseguição a cardumes e caça aos cetáceos ocorria grande confusão entre barcos de diferentes procedências. Aos poucos, devido ao aumento da demanda e ao aprimoramento da tecnologia pesqueira, a abundância desses animais diminuía, obrigando a exploração de regiões marítimas mais inóspitas, com os polos gelados do sul e do norte. Apenas no século XX, com a industrialização das atividades de caça e pesca, a possibilidade de redução dos estoques começou a ficar evidente. Então, surgiram alguns tratados de controle de extração de baleias e de espécies como os linguados (halibuts) e, em 1935, entrou em vigor uma convenção sobre regulação da caça à baleia, dessa vez extensiva a todo planeta.
Com o crescimento das cidades na área costeira dos continentes e a produção industrial, os oceanos passam por efeitos da poluição por esgotos domésticos, sedimentação, lixo, efluentes químicos e orgânicos. A exploração do petróleo no mar trouxe impactos ainda maiores, não apenas pelas consequências da extração e do seu uso, mas também pelos perigos do transporte global do produto através dos mares por dutos ou navios. A extração petrolífera no mar começou pelos anos 1930, inicialmente no Golfo do México, a partir do Texas, e na Venezuela. Ao longo do século XX, vários campos marítimos foram sendo descobertos e explorados ao redor do planeta. No Brasil, por exemplo, o campo petrolífero de Santos conta com a quinta maior reserva de 'offshore oil' do mundo.
A criação das Nações Unidas em 1946 incrementou o estabelecimento de uma legislação planetária nas questões do mar, estabelecendo regras acerca da soberania dos Estados costeiros sobre as águas circundantes em oposição à chamada área (o alto-mar), incluindo a gestão do transporte intermarítimo, do uso dos recursos oceânicos e da conservação dos ecossistemas marinhos. A poluição marinha afeta os ecossistemas aquáticos, mas também a vida humana. Nesse contexto, foi elaborada a citada Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982, afora tratados sobre temas pontuais como a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios.
Na entrada do terceiro milênio, o saber sobre os oceanos se aprimorou: os ecossistemas se tornaram mais conhecidos e estudados, os recursos minerais do solo oceânico estão sendo mapeados e avaliados em sua viabilidade econômica. Não se trata mais apenas de petróleo, mas também de reservas significativas de outros minérios, localizadas no fundo dos mares: os nódulos polimetálicos, pepitas do tamanho médio de bolas de tênis, soltas no fundo de algumas áreas do fundo do mar, contendo cobalto, ferro, manganês, paládio, ouro e outros minérios e os nódulos; sulfetos polimetálicos, lama hidrotérmica com cobre, zinco, chumbo, ferro, prata, ouro etc., e crosta ferro-manganesa. Há também minérios radioativos, explorados em escala significativa na zona da costa angolana, para dar um exemplo. As técnicas de extração desses minérios, feitas com sondas e máquinas de sucção e perfuração arrasam extensas áreas do solo marinho, destruindo habitats e extinguindo espécies.
A agência reguladora das prospecções e exploração da atividade minerária no fundo do mar é o International Seabed Authority - ISA, (Autoridade Internacional do Fundo Marinho), organismo autônomo vinculado à Convenção da ONU do Direito do Mar, criado em 1982, e consolidado em 1994, com sede em Kingston, Jamaica. A agência conta com 168 membros, todos signatários da Convenção do Direito do Mar.
A exploração de minérios do solo oceânico tende a ocorrer em alto-mar, na área fora dos limites de jurisdição nacional, que corresponde a 54% dos oceanos do planeta. Cumprir metas do desenvolvimento sustentável no quesito exploração do fundo do mar passa pelo ISA, que pode conceder autorização de pesquisa e uso a nações e empresas. Por exemplo, a pesquisa, ensejando uma futura exploração, pelo Brasil das riquezas minerais da Elevação do Rio Grande, formação geológica a 1.500 km da costa do estado do Rio Grande do Sul, em águas internacionais, foi autorizada pelo ISA em 2014.
A conservação de ecossistemas marinhos entra como objetivo do desenvolvimento de um capitalismo sustentável, o qual desvia o foco na destruição feita por suas atividades predatórias nas profundezas escuras do alto mar ao elaborar metas para mais investimentos em ciência, em tecnologia, na mobilização das pessoas para a "causa" da sustentabilidade.
A ONU sinalizava há anos que após a Declaração dos Objetivos do Milênio, caracterizada principalmente pela ênfase na economia verde, o planeta estaria diante dos desafios de investimentos voltados à economia azul. Da mesma maneira que fazia menção ao fato que o espaço sideral ainda é mais conhecido do que a vida na profundeza dos oceanos. O termo economia azul foi cunhado pelo Belga Gunter Pauli em seu livro The blue economy: 10 years, 100 innovations, 10º million Jobs. Em junho deste ano a ONU fez um debate temático sobre o ODS 14, reunião preparatória para a Conferência dos Oceanos da ONU de 2022 que ocorrerá em Lisboa. No debate preparatório para o ano que vem a ONU sublinha: "a economia azul sustentável se encontra no coração do ODS 14".
R A D. A. R
Lei nº 8.617, de 4 de janeiro de 1993. Zoneamento marítimo do Brasil
Adequação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 ao Brasil
Ipea avalia as metas e indicadores para monitorar os oceanos
Caderno IPEA ODS14
ODS14 IBGE
Criação de Grupo Técnico ODS14, 2020
Luta contra a pesca INN
Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar
Auditoria da Pesca: avaliação integrada da governança, da situação dos estoques e das pescarias, Brasil 2020
Economia do mar
Programas de Monitoramento dos Recifes de Coral
Programa de monitoramento de ambientes recifais do Parque de Abrolhos (2019-2020)
Década da Ciência do Mar
Década do Oceano e a Marinha Brasileira
International Seabed Authority - ISA
Regiões de mineração submarina
Exemplo de mineração no fundo do mar: BP Angola
O observatório ecopolítica é uma publicação quinzenal do nu-sol aberta a colaboradores. Resulta do Projeto Temático FAPESP – Ecopolítica: governamentalidade planetária, novas institucionalizações e resistências na sociedade de controle. Produz cartografias do governo do planeta a partir de quatro fluxos: meio ambiente, segurança, direitos e penalização a céu aberto. observa.ecopolitica@pucsp.br
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