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Depois de realizar uma extensa pesquisa sobre a emergência da ecopolítica do planeta, inauguramos o observatório ecopolítica, na puc-sp, vinculado ao nu-sol, núcleo de pesquisa autogestionário, que publicará análises de seus pesquisadores e de interessados relativas aos fluxos meio ambiente, direitos, segurança e penalização a céu aberto.

O planeta como alvo de governo transterritorial coincide com mudanças cada vez mais significativas na gestão da vida, produzindo suas verdades relativas à nova maneira de pensar e produzir o vivo com vistas a consolidar melhorias para as futuras gerações. Os resultados dos ODM (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio), traçados pela ONU e programados para serem alcançados no período 2000-2015, desdobraram-se em Objetivos de Desenvolvimentos Sustentável (ODS) previstos para serem alcançados até 2030. Os ODM tinham como meta elevar as condições de saúde, educação, introduzir a gestão do meio ambiente, produzir mais seguranças nos Estados considerados em desenvolvimento e naqueles considerados sob condições mínimas precárias. Os novos objetivos, por sua vez, são destinados a todos os Estados, sob a forma de gestões compartilhadas. A racionalidade neoliberal consolidou um gradiente a ser governado pelo capitalismo sustentável como governamentalidade planetária.

Não há liberdade liberal ou neoliberal que não se funde na segurança. Diante das sucessivas crises quanto ao manejo e os usos dos recursos naturais, realizaram-se a partir de muitas contestações significativo número de eventos pretendendo diagnosticar e definir as crises em torno da ameaça da continuidade humana no planeta. Estes embates e a busca pela concórdia trouxeram desdobramentos que compõem o dispositivo meio ambiente. Os grandes encontros realizados desde o Clube de Roma, em 1968, e seus incrementos sequenciais em reuniões mundiais, conectando empresários, Estados e sociedade civil organizada, definiram a sustentabilidade, desde o relatório Nosso futuro comum, em 1987, como programática de produção de riquezas para uma governança global.

Do mesmo modo, a pletora de direitos que se desdobra desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), em 1948, encontra um modo de subjetivação que se consolida com o anúncio de povos resilientes em um planeta resiliente pela ONU em 2012. Os históricos dispositivos de segurança dos Estados-nação, compostos das práticas diplomático-militar, em escala internacional, e policial, no âmbito interno, viram as missões de paz se voltarem para a reconstrução democrática de Estados e os ataques de coalizões militares, com ou sem a chancela da ONU, desdobraram-se em ocupações sem previsão de término.

Ainda que as tensões entre Estados continuem (e a iminência da guerra permaneça como a condição prévia para a paz entre Estados), as novas formas de intervenção, visando às pacificações internas como condição prévia para a institucionalização da democracia, produziram o dispositivo diplomático-policial. A função de polícia repressiva conta agora com a participação do cidadão na gestão do controle de si e dos outros, proporcionando o compartilhamento de ações que pretendem alcançar efetividades imediatas e que, gradativamente, passa também a governar as denominadas áreas/zonas degradadas socialmente no interior dos Estados.

Não estamos mais diante das vigilâncias sobre os degenerados, os inimigos internos vistos como perigosos e anormais. A cultura do castigo fundante da cultura greco-romana é redimensionada, não mais segundo as relações normalizadoras almejadas pela relação vigilância-punição, própria do governo das disciplinas acopladas aos direitos de soberania modernos, mas agora conecta-se às práticas de monitoramentos sócio-culturais e eletrônicos da sociedade de controle. As instituições austeras se elastificam, assim como as punições, e o degenerado é redimensionado como degradado: o sujeito universal transtornado como ponto de investimento em fluxos que deve normalizar o normal. A psiquiatria e as neurociências, por conseguinte, assumem a condução dos prognósticos normalizadores, situando e orientando a gestão da vida equilibrada possível e a ser governada por todos.

Os efeitos desses diversos dispositivos (meio ambiente, resiliência, diplomático-policial e monitoramento) produzem o novo dimensionamento dos modos de subjetivação governados pelo controle de si e dos outros. Condutas tolerantes para a cultura de paz devem ampliar a chamada qualidade de vida e reduzir vulnerabilidades monitoradas por índices de prognósticos e aferições. Desse modo, espera-se que a participação de cada um na gestão dos problemas sociais seja mais eficaz no interior da máxima que pretende abarcar e conectar o local e o global.

A governança global reveste o indivíduo de sua casa ao Estado e às conexões planetárias até a ONU e dessa retorna, sob a forma modulável, a cada um. A racionalidade neoliberal, ao redimensionar a força de trabalho em capital humano, expandiu as práticas de gestão compartilhada dinamizando a participação e disseminando valores democráticos do âmbito político ao econômico. A sociedade de controle aciona cada vez mais fluxos de participação, monitorando condutas, ampliando seguranças, direitos, zelo pelo meio ambiente e dando ao capitalismo sustentável a nova faceta transcendental empírica pretendida pelo capitalismo como utopia da sociedade democrática, livre e em direção à paz entre Estados. Emerge o ambiente planetário a céu aberto!

A ecopolítica tem por alvo o planeta e o que é vivo para além do que convencionalmente se definia como sendo o dentro e o fora dele, seja na ocupação do espaço sideral em torno da Terra, seja na busca pelos exoplanetas, como redimensionou a física desde a teoria da relatividade, contemplando a noção de universo em expansão. A biopolítica, portanto, é uma de suas facetas, na medida em que a população não é mais pensada e, por conseguinte, governada nos limites territoriais da soberania e em função do controle do melhor governo de cada Estado.
Se a explosão das bombas de Hiroshima e Nagazaki, em 1945, encerrou o evento bélico II Guerra Mundial, ela levou a novos efeitos de segurança transterritoriais e também moveu, nos variados cantos do planeta, a contestação dos usos violentos e pacíficos da energia nuclear, mobilizando componentes que formataram o dispositivo meio ambiente com suas lutas e programas contra a degradação.

Os projetados planeta e cidadão resilientes terão de enfrentar as novas formas do terrorismo transterritorial que atinge no momento a intenção de constituir Estados independentemente da territorialidade das convencionais nações, como o Estado Islâmico. Monitoramentos de superfície, profundidade e siderais dimensionam e procuram controlar o vivo no planeta e suas lutas, guerras e gestão das espécies.

Do corpo individual no capitalismo industrial, que recebeu investimentos em sua força mecânica pelas disciplinas e pela biopolítica enquanto espécie, interessa agora sua inteligência como capital humano, sua perene jovialidade, sua competividade e capacidade inovadora. Os direitos para tal consolidam o empreendedorismo e governam as chamadas formas de empoderamento de minorias, agora como conjuntos dilatados de vulneráveis, voltados para a restauração, proteção, prevenção e precaução relativas ao corpo, do mesmo modo que investimentos de toda sorte também buscam restaurar as cidades, seus monumentos históricos, seus pontos turísticos, enfim, seus espaços a ser embelezados.

A ordem depende de monitoramentos seguros de coisas, gentes, palavras e imagens. Cria-se, enfim, a constatação de que tudo se encontra inacabado e que o esforço de cada um e de todos na governança global seja capaz de consolidar uma cultura de paz em perpétua atualização.

As relações ascensionais e descensionais de poder produzem resistências contínuas em fluxos, que necessitam ser mitigadas pelas novas práticas que governam os modos de subjetivação resiliente.

A disseminação das práticas democráticas em todas as relações, não mais circunscritas às políticas propriamente ditas, tende a destinar ao ostracismo as intenções revolucionárias procedentes dos movimentos advindos do século XIX e que teriam se esgotado com o fim da URSS e com o ajuste neoliberal da ditadura do proletariado na China.

Porém, desde os anos 1990, as revoltas passam a rapidamente aparecer e, com suas existências efêmeras ou não, a configurar novos modos de subjetivação das resistências que vão destemidamente dimensionando a trans-historicidade do cinismo grego, produzindo um novo cuidado de si e novos pronunciamentos parresiásticos. Os saberes insurgentes são indomesticáveis.

Sob e contra o regime da participação incentivada e efetivada de novas construções da vida em transformação, trata-se de se opor destemidamente às ilusões da pacificação política, configurando uma atitude antipolítica. Se o militantismo organizado pacificou o confronto reconduzindo-o aos parâmetros platônico-aristotélicos, a revolta, por sua vez, escancara a recusa não só da filosofia prostrada e cada vez mais professoral, portanto acadêmica, para sinalizar compreensões da emergência dessa vida outra, que mais uma vez reinsere os anarquismos como práticas atualizadoras, impossíveis de serem propositalmente renegadas ou destinadas ao esquecimento como um saber insurrecional singular, mas superado.

Os anarquismos, como antipolítica, desvencilham-se dos julgamentos autoritários e, mais uma vez, dispensam-se de ter um quadro teórico fixo, constante e imutável. As resistências não cessam e as revoltas, aos poucos, indicam os traçados de um modo de subjetivação que recupera e opõe o cuidado de si diante do controle de si e dos outros para delinear e realizar de modo insolente e aguerrido a vida outra.

Acompanhe o informativo quinzenal do observátorio ecopolitica: clique aqui.

 

 
nu-sol
 
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