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Odores d’antanho


Odores d'antanho


Não só de fatos é feita nossa memória. As sensações cumprem um rico papel na tessitura das lembranças; se não, vejamos:

Cafezal – É de Ribeirão Preto. Naquele tempo, em vez de canaviais, eram os cafezais que dominavam a paisagem. O ramal ferroviário da Mogiana corria por dentro do cafezal e eu ficava quase hipnotizado no meio daquela paisagem homogênea, filas e mais filas de cafeeiros subindo e descendo morros, o verde do cafezal em contraste com o vermelho da terra. Na época da floração, era o branco que ressaltava e o perfume das flores miúdas se expandia por quilômetros. Hoje, a cana tomou conta, mas não tem o mesmo encanto.

Cevada da Antárctica
– Pouca gente no Brasil desconhece o Pinguim. Pinguim e Ribeirão, durante muito tempo, formavam dupla inseparável. A Antárctica ficava no meu bairro, Vila Tibério e, toda manhã, uma fileira de carroças saía da fábrica carregando na caçamba a cevada fermentada, quentinha e exalando aquele saboroso perfume, promessa de boa cerveja. Após cumprir a nobre missão de gerar a melhor cerveja do Brasil, aquele subproduto se destinava à engorda de suínos. Por isso, o torresminho de lá era insuperável e não engordava... a mim, pelo menos. 

Incenso do turíbulo – Claro, era o cheiro da igreja onde eu era coroinha. Os grãos de resina depositados sobre as brasas do turíbulo desprendiam odor de coisa sacra. Os coroinhas eram treinados para mover o turíbulo, olhando só pra frente, mas o Mengel não tinha jeito, acompanhava o movimento pendular com a cabeça. Seu apelido: Zé Fidelis, um bonequinho de vitrine que movia a cabeça de um lado para o outro.

Bolos da Mãe – No fundo do meu quintal, havia um forno e em vésperas de alguma festa, havia bolos assando. Apesar de menino, não era muito fissurado em bolos, mas não posso negar que o aroma que vinha daquele forno era de dar água na boca.

Esterco de cavalo – Quando ia à chácara de meu nono Batista, era sempre recebido pelo bafo que escapava da esterqueira, onde se depositava o subproduto das cocheiras. Era um perfume amigo, nada agressivo, puro cheiro de natureza. A gente ia para a chácara só pra tomar a benção do nono, mas, por mera coincidência, havia por lá manga, jabuticaba, laranja, goiaba, pitanga – essa só eu sabia onde estava. De vez em quando, meu primo Lucindo e eu saíamos com estilingue para caçar juriti, uma pombinha do mato. Confesso que nunca acertei em uma sequer. Vai ser ruim de pontaria assim na, no...  Sorte das juritis!

Manjericão do mato – O mato de minha terra cheirava a manjericão. Só depois de grande fui saber que aquele matinho era usado como condimento. Até hoje, quando traço uma redonda “Margherita”, me lembro do mato do meu bairro.

Laranjal – Agora, falo de Rio Claro. O meu colégio situava-se em meio a um enorme laranjal, no alto de uma colina. Quando o branco das flores enfeitava aquela imensidão de cinco mil pés de laranjeiras, o perfume que subia até as salas de aula era algo para nunca mais a gente esquecer. Depois todo esse perfume era transferido para os favos do mel produzido na chácara. Acho que, por conta do mel que consumíamos na merenda, dificilmente a gente ficava doente.

Rio “cheiroso” – Nem é preciso dizer que esse “cheiroso” era pura ironia da molecada. O riozinho coitado não tinha nome, mas seu perfume só poderia ser proveniente de alguma fábrica de chucrute, tamanho era o odor de repolho processado.

Citrodora – É esse o nome botânico do popular “eucalipto cheiroso” - cheiroso sem ironia. O Horto Florestal de Rio Claro era rico dessa espécie. Bastava leve brisa para espalhar aquele perfume cítrico por quilômetros. Foi a Companhia Paulista de Estradas de Ferro que plantara em cidades do interior - servidas pela estrada de ferro - diversos hortos destinados a fornecer lenha para as locomotivas a vapor e madeira para os dormentes. É, naquele tempo já havia quem pensasse em sustentabilidade.
Odores são sempre eternos nas nossas recordações, são sempre presentes. Toda vez que surgem imagens na nossa imaginação, trazem a presença de coisas ausentes, mas presentes no coração.

 


Prof. Waldir Biscaro
awbiscaro@uol.com.br



 
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