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Escutar, de coração


Ouço uma música ao longe. Parece-me bela, mas não consigo distingui-la no meio de tanto ruído. Incisiva e ao mesmo tempo tranqüila, suave. Tento escutá-la. Vou ao encontro do som. Isolo-me e concentro-me.

Agora consigo distinguir seus acordes, sua harmonia. Estou escutando sua melodia e ela me sensibiliza, acerta-me o coração.

Algumas músicas, além da melodia, têm poesia, mensagem...

Quantas vezes, escutando a melodia de uma música, apenas ouvimos a voz de quem a canta, sem perceber a poesia. A voz parece ser mais um ruído interferindo no clima que a melodia cria.

Por outro lado, quando lemos a letra de uma música, sem sua melodia, não percebemos as nuances que nos levam a senti-la por inteiro.

Se nos concentrarmos, prestando atenção à letra e à melodia, a obra se completa, uma idéia inteira, com começo, meio e fim que nos enleva e nos faz pensar.

Às vezes a mesma música tem outro arranjo, uma interpretação única e exclusiva, levando-nos a conhecer os sentimentos do intérprete; são pequenas nuances que precisam ter toda a nossa atenção. Nessas ocasiões, cometemos um erro enorme, ao cantar junto, pois encobrimos a mensagem subliminar que vai direto ao coração.

Com todos os ruídos que encontramos numa cidade como a nossa, com milhões de informações a cada dia, com o pouco tempo que nos permitimos, está cada vez mais difícil escutar. A ansiedade toma conta de nós.

Enganos, equívocos, mensagens truncadas, nossas idéias com a urgência de serem levadas adiante... Enquanto outros falam, já nos preparamos para falar o que pensamos, às vezes sem perceber que partilhamos da mesma opinião; o outro, por sua vez, se repete e vira uma discussão de surdos.

Ouvimos, não escutamos. Não nos permitimos escutar. Não abrimos espaço e tempo para perceber a melodia das palavras, a expressão do interlocutor, seus verdadeiros sentimentos, suas intenções e muito menos suas idéias, porque estamos tomados pelo anseio de falar. Porque o espaço e o tempo são muito disputados.

Todos precisamos aprender a escutar e não só a ouvir. Ouvir é perceber ruídos, escutar é entender o conteúdo das idéias, as expressões do interlocutor, seus sentimentos, suas intenções.

A expressão das pessoas só acontecerá por inteiro, se os ruídos à volta forem neutralizados, se existir começo, meio e fim. Ultimamente as pessoas não conseguem completar suas idéias, as mensagens vêm truncadas, não sabemos nem escrever uma carta sem abreviações de palavras. Chegamos a ponto de, numa correspondência, engolir as letras da palavra mais importante de uma comunicação entre duas pessoas: a palavra “você” virou “vc”!

Precisamos iniciar um grande movimento, começando por nossa família, amigos, conhecidos, nossa comunidade e espalhar pelo mundo: se não nos permitirmos escutar – e não só ouvir – nunca chegaremos à PAZ!

Ouço uma música ao longe... Vou ao encontro do som, concentro-me e consigo escutá-la.


 


Maria Helena Sales Penteado


 
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Edição Nº 29
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