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Dom Quixote

As mãos lânguidas de minha avó folheavam demoradamente as páginas de um livro, todas as noites em que nos reuníamos numa espécie de sarau.

Uma sala com pouca iluminação, uma “silla” num dos cantos, um abajur desbotado, uma máquina de costura “Singer” que ainda produzia lindos vestidos, um manequim sem braços que me assustava porque parecia ter vida... e tinha...

Minha avó teria vindo da Espanha com 5 anos, mas ainda mantinha, por orgulho, seu sotaque de origem.

Na pouca bagagem, trazia um baú enferrujado, poucos quadros, algumas roupas amareladas e um livro – preciosidade, como dizia ela...

Suas mãos finas folheavam demoradamente as folhas desse livro que denominávamos “A Bíblia Espanhola”...

- Dom Quixote

Livro escrito por Miguel de Cervantes Saavedra, nascido em 1547, na Espanha.

Muito volumoso, com linda capa de couro verde e inscrições douradas, 603 páginas – livro para a vida inteira... E assim foi...

Hoje entendo seu amor pelo livro; pois ela sempre foi uma “quixotesca”.
           
Muitos conhecem o signo “Quixote”, mas poucos leram a obra desse velho sonhador e seu cavalo Rocinante, que adorava livros, a ponto de acreditar ser um de seus personagens...

Minha avó... lutou pela vida – não com uma espada, mas com o ruído incessante de sua máquina de costura em que, nos intervalos de nosso “sarau”, ganhava o sustento de sua família – Esse ninho imenso onde cabíamos todos.

Vi-a estampada em fotos. Sorridente, altiva e ambígua. A mesma sóbria, mulher de um revolucionário espanhol.

E ao recordá-la, naquela lucidez irreverente, sempre cavando a vida item por item, acreditei que os fatos da vida estavam escritos nesse livro, mas, que ninguém conseguiu formular como eu havia feito.

Esse amor pelo livro nasceu da minha esperança, das minhas alegrias, do meu sofrimento.

O desabrochar espontâneo desta intimidade para mim significou enriquecimento interior e maturidade, não só pelas agradáveis noites do “sarau”, mas, pelas boas coisas partilhadas que durante anos fui ouvindo e aprendendo através dessa mulher – “Dolores” –
e desse homem – Dom Quixote de La Mancha, cujo livro de 603 páginas, folheio nas madrugadas de insônia.

Nota: Só para mim nasceu Dom Quixote, e eu para ele; ele para praticar as ações e eu para as escrever...

As últimas palavras de minha avó: “Cuando me muera, enterradme bajo la tierra con mi libro”...

Assim foi feito...

Profa. Maria Chiesa

 
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Edição Nº 29


* Os artigos publicados no jornal Maturidades são de inteira responsabilidade dos autores
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