Eu posso ser você amanhã...
Dia desses deparei-me com algo que, quase, me tirou do sério... Ao tomar um ônibus, parei para esperar uma senhora, não tão idosa, mas de aparência frágil e insegura, que quase chorando e com muito medo de cair, relutava em descer daquele degrau exageradamente alto, como acontece em boa parte dos ônibus que circulam pela cidade. Auxiliada por duas pessoas que passavam no momento e, contando com a gentil paciência do motorista, a ajudamos a descer, após alguns minutos, tentando encorajá-la e convencê-la.
Feito isso, entrei, agradeci e elogiei a atenção do motorista. Apesar de o ônibus estar lotado, sentei-me no primeiro banco – aquele destinado aos idosos, mulheres grávidas ou portando crianças de colo ou pessoas com deficiências – e pela janela fiquei olhando para aquela senhora de andar meio trôpego a caminhar tão sozinha...
De repente, duas vozes estridentes e insensíveis, sem idades definidas, vindas em alto som de alguns bancos atrás do meu, tiraram-me do meu olhar e pensar, e eu custei a acreditar no que diziam:
- Era só o que faltava, o ônibus perder tanto tempo esperando para uma pessoa poder descer...
- Quem não tem capacidade de andar sozinha tem mesmo é que ficar em casa...
- Onde já se viu envelhecer de qualquer jeito, assim...
- A pessoa que se preza tem que saber envelhecer...
E não parou por aí o cruel duelo de palavras, como se dependesse de nós o saber envelhecer... Santo Cristo!!!
Ainda bem que já estava chegando no meu ponto de descida e eu, estarrecida pelo que escutara, ia finalmente livrar-me daqueles impropérios, daquela falta de solidariedade humana.
Antes de descer, porém, respirei profundamente e não me furtei de pensar... de ficar matutando cá com os meus botões... tentando adivinhar como será a velhice dessas pessoas que não têm a sensibilidade de entender, ou pelo menos de tentar entender a velhice dos outros... Oportuna é a advertência na frase colocada nos ônibus: “Respeitar o idoso é respeitar a si mesmo”.
É como bem disse Simone de Beauvoir: “Velho é o outro”.
Albanita de Paiva
albanitadepaiva@terra.com.br
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