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Quem manda, manda...

Quem me ensinou a gostar da história foi Monteiro Lobato com sua “História do Mundo para Crianças”. E não posso esquecer de Viriato Correia e a “História do Brasil para Crianças”. Esses escritores me mostraram a história como uma grande aventura humana.

Como qualquer garoto que gosta do estudo da História Universal, sempre me encantava pelos grandes personagens. Até aí tudo bem. Acontece que boa parte – não confundir com Buonaparte - dos mais famosos líderes da história, se não todos, têm fortes traços de autocracia. Preciso citar nomes?

Só sei que minhas primeiras lições de liderança foram sacadas das histórias de grandes caras e apenas bem mais tarde é que tive contato com outras abordagens e estudos do funcionamento da liderança em situações de normalidade, como liderança na educação e no trabalho.
No início de minha carreira profissional como professor, pelo que me lembro, pouco ou nada se falava sobre relacionamento democrático com os alunos. Já em minha experiência dentro de empresa, tive a sorte grande de pertencer a uma equipe dirigida por uma pessoa que transpirava democracia: Pierre Weil.

Foi nessa temporada que tomei contato com os estudos de Kurt Lewin, de Lippit e White e com a experiência da socianálise.
Minha sorte se completou quando fui designado para dar o curso de “liderança de reuniões” no treinamento de gerentes e supervisores. Tratava-se de um curso todo programado e feito com exercícios práticos, na linha do TWI. Isso era em 1961.

As práticas democráticas nas relações de trabalho, apesar de recomendadas desde o início dos anos vinte, somente começaram a se incrementar, muito timidamente, na segunda metade do século passado, após a guerra. Tinha-se a impressão de que haveria total incompatibilidade entre gestão de empresas e estilo democrático. Era o taylorismo que ditava a conduta dos dirigentes, por isso a autocracia prevalecia tanto nas empresas americanas como nas da União Soviética, onde, por sinal, permaneceu mais tempo.

Muito pretensioso, me propus a levar democracia para dentro das empresas por onde passasse. Meu ideal seria socializar, mas isso ficaria pra mais tarde. Por isso, em todo trabalho de formação de supervisores e gerentes, o maior destaque era sempre o desenvolvimento de atitudes e condutas de liderança democrática.

Teoricamente, eu deveria ser um cara impregnado de atitudes democráticas e a condução de meus grupos deveria corresponder a tais atitudes. Será?

Em uma das passagens pela gerência de Departamento de Desenvolvimento, tive oportunidade de testar essa “minha democracia”.
A equipe, apesar de muito jovem, era de primeiríssima linha e eu me julgava o gerente mais democrático do mundo. Isso, até receber o “feedback” da turma.

Após preparar todo o cronograma de atividades para o segundo semestre - democraticamente feito só por mim – sofri um surto de autêntica democracia. Chamei a equipe, entreguei o cronograma e pedi para eles se reunirem, sem minha presença, para analisar e dar sugestões em cima de minha proposta.

A turma se reuniu, debateu com liberdade, refez todo o cronograma e só depois me convocou. Minha primeira reação foi de rejeição das mudanças por eles propostas - eles haviam reduzido em quase um terço a programação. Depois, respirei fundo e perguntei: Onde estava a falha do meu plano de trabalho?

Simplesmente meu cronograma de treinamentos e de atividades era tão lotado que não deixava espaço para a equipe respirar. Não havia intervalo para troca de idéias e de experiências. Tudo se resumia no “pau na máquina” e “bola pra frente”!!!! Uma neurótica obsessão por números.
Depois da lição, passei a submeter os planos a debate com toda equipe e a abrir mais espaço para o grupo.

Havia percebido que até então não passara de um AUTOCRATA EDUCADO. Mais ou menos como às vezes acontece com certos neuróticos: eles sabem de cor e salteado as teorias de Freud, porém permanecem empedernidos em sua neurose.


Waldir Biscaro
awbiscaro@.uol.com.br

 
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