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Apologia não, apenas um convite à reflexão...

Começar uma discussão sobre aborto não é uma tarefa fácil, isto porque a mesma, além de envolver convicções morais e religiosas, também provoca um viés para o debate sobre o ponto menos importante da questão: o conflito entre os favoráveis e os contrários ao aborto.
Este posicionamento também traz à tona considerações importantes a serem feitas, pois uma questão é perguntar quem é a favor ou contra a realização do aborto e outra, bem diferente, é perguntar quem é contra ou a favor da prisão de mulheres que abortaram. Seriam estas mulheres criminosas homicidas?
Atualmente, no Brasil, o aborto é considerado crime, exceto em duas situações: de estupro e de risco de vida materna. A proposta de um Anteprojeto de Lei, que está tramitando no Congresso Nacional e alterando o Código Penal, inclui uma terceira possibilidade, quando da constatação de anomalias fetais.
Se por um lado existem discussões sobre os aspectos legais e os direitos do feto diante dessas três situações para o aborto, por outro lado, nada se fala sobre os direitos e os conflitos vividos pelas mulheres que estão imersas nesse dilema.
Fazer um aborto implica passar por um processo doloroso (físico e mental), que lida com sérios riscos de saúde e consequências que vão desde o enfrentamento familiar até a prisão. Definitivamente, é ingênuo pensar que uma mulher teria o aborto como sua primeira opção de método anticoncepcional.
A defesa da saúde do feto e a idéia de que a Vida começa na concepção são grandes bandeiras levantadas pelos partidários contra o aborto; a banalização do tema e do próprio ato abortivo é um dos grandes temores desses grupos.
Por outro lado, entidades feministas, médicos, juízes e advogados defendem a descriminalização com base na saúde de milhares de mulheres.
O Brasil figura entre os países que apresentam as maiores restrições à interrupção voluntária da gravidez. Como consequência os dados são alarmantes. Segundo o Ministério da Saúde, em média 250 mil mulheres são internadas anualmente com complicações decorrentes de abortos clandestinos. Entre 2007 e 2008, o número de curetagens pós-abortamento, realizadas na rede pública de saúde, ultrapassou os 362 mil, sendo aproximadamente 23% desse total em crianças e adolescentes (8-19 anos).
No relatório da CPI da Mortalidade Materna, da Câmara dos Deputados, são apontados alguns aspectos mundiais do fenômeno das mortes maternas, sistematizados em documentos da Organização Mundial de Saúde, destacando-se:

A) a causa de morte materna mais comum em todo o mundo é a hemorragia. Um quarto das mortes são atribuíveis a ela, especialmente quando não existe estrutura de atendimento, drogas ou transfusões para contê-la, sendo esse índice agravado em países onde o aborto é ilegal;
B) as infecções causam 15% dos óbitos, geralmente consequentes das más condições de higiene durante o parto ou por doenças sexualmente transmissíveis não tratadas ou por tentativas de aborto sem as devidas condições de higiene e sanitárias;
C) as complicações de abortos chegaram a causar 13% das mortes maternas, embora em algumas partes do mundo ele chegue a provocar um terço delas - no Brasil, já provoca 5% das causas;
D) a questão do aborto pode, na verdade, ser ainda mais importante do que esses índices apontam, pois é razoável considerar a existência de uma subnotificação geral sobre o aborto, devido à ilegalidade da prática em inúmeros países em desenvolvimento. É provável que os índices de infecções e hemorragias encubram sequelas de tentativas de aborto em más condições, fazendo com que a questão do aborto não seja considerada a terceira causa, mas algo ainda mais importante e urgente para ser discutido quando se discute mortalidade materna.


Dados como estes enquadram o debate não apenas na esfera dos direitos pessoais, mas também no domínio da saúde pública.
No Brasil são realizados mais de 2740 abortos inseguros por dia, sendo que uma em cada 15 brasileiras já cometeu tal prática. Entre os motivos observam-se: imaturidade dos pais e o medo da rejeição familiar; rejeição ao feto resultante de práticas sexuais ilegais (incestos e estupros, inclusive entre membros da mesma família); condições financeiras desfavoráveis, ou até mesmo o despreparo psicológico para enfrentar a criação de mais um filho.
Os números indicam que a prática do aborto, mesmo o irregular, sob péssimas condições de higiene e saúde, é real e não apenas ficção de novela. Os mesmos dados nos levam a outra constatação: a simples criminalização da prática não é a solução, apenas vem agravando o problema.
Tal criminalização normalmente penaliza, de forma desigual na sociedade, mulheres jovens e pobres, de baixo nível escolar. São as mais afetadas porque, no caso das classes média e alta, estas têm acesso, mesmo que clandestino, a serviços particulares com maiores cuidados e qualidade superior.
Uma pequena parcela das mulheres é a favor do aborto em si, em casos especiais, mas ter essa alternativa é de extrema importância, não só porque ela deve ter autonomia em sua vida, mas também porque uma gravidez não desejada traz problemas para todas as partes envolvidas (criança, mãe e familiares...).
Nos idos de 1980, apenas 23% da população era a favor do aborto realizado em caso de estupro ou risco de vida materna e mesmo assim a lei foi colocada em prática. Hoje, cerca de 78% das pessoas concordam com a lei e ainda acham que a mesma deve ser estendida aos casos de anencefalia. Isso mostra que a sociedade, nesses últimos 25 anos, muda assim a forma de ver o aborto.
Manter a discussão sobre o aborto apenas no âmbito da esfera criminal é o mesmo que condenar cerca de 1 milhão de mulheres, ao ano, à prisão e sem direito a defesa. Considerando-se que, em sua grande maioria, os argumentos contrários ao aborto se pautam em religião e moralidade, sendo o Estado laico, essas condicionantes não deveriam influenciar a lei e sua prática.
Hoje, 48 países já garantem o aborto legal e seguro à sua população. Segundo dados das Nações Unidas, em sua grande maioria, os níveis de abortamento vêm diminuindo, ou pelo menos se estabilizando, contrariando um reticente argumento da oposição de que, com a liberação do aborto, o mesmo seria banalizado, provocando um enorme crescimento em sua prática.
O ideal seria se fossem realizadas campanhas educacionais maciças, educação sexual nas escolas, orientação psicológica de mulheres jovens e de casais, e o prénatal em diversas camadas sociais. Ações estas aliadas à segurança dessas mulheres que deveriam decidir sobre suas próprias vidas, amparadas pelo Estado e pela legislação. Tais medidas certamente são eficientes meios de regularização da prática do aborto, muito mais do que sua criminalização.
Não se trata de uma apologia ao aborto, de se posicionar contra ou a favor de tal decisão, mas sim de se abrir ao debate e à reflexão, à luz de mais informações, sem preconceitos ou dogmas.
A orientação está feita, só cabe a você aceitá-la ou não !!!


         

Prof. Alessandro Augusto Rogick Athiê
Biólogo e mestre em ciências
aleathie@gmail.com

 

 
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Edição Nº 29
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