O retorno dos valores na  sala de aula
                                                                       A relação  professor-aluno mudou muito nos últimos 30 anos. É comum ouvirmos que  “antigamente” as coisas eram diferentes e fala-se, com nostalgia, de um tempo  quando a figura do professor era a de um profissional respeitado, quase um  “dono do saber” que nunca estava errado e que impunha sua autoridade a crianças  muitas vezes assustadas ou temerosas dos castigos e das avaliações rigorosas.
                                                                          
Atualmente, o papel se inverteu. De  respeitável, a docência passou ao “cruz credo”. É só perguntar a um adolescente  se ele deseja se tornar um professor e é bem provável que ele responda: “Deus  me livre! Nem pensar”. Essa mudança radical no modo como a sociedade vê o  professor já causa problemas nas redes públicas onde há vagas sobrando e poucos  interessados em partilhar o seu conhecimento com crianças e adolescentes. Isso  nos leva a pensar nas mudanças culturais que sofremos e que transformaram a  profissão antes respeitada em emprego indesejado.
Toda mudança de comportamento se  deve à variação dos valores que circulam em um determinado grupo social.  Voltemos um pouco no tempo e vamos pensar em que valores a sociedade baseava o  respeito ao professor. Há 50 anos, nosso país, tradicionalmente católico,  achava que ter um emprego respeitável e honesto, mesmo que modestamente  remunerado, era o papel dos bons cidadãos. Ser professor também era viável e  socialmente aceito como profissão para as mulheres. O professor era, então, a  autoridade em sala de aula, muitas vezes desempenhando sua função de modo  autoritário e sem abrir espaço para o diálogo entre ele e seu aluno. Suas aulas  eram, de modo geral, expositivas e inúmeras lousas eram preenchidas pelos  docentes e copiadas pelos alunos. Havia pouco espaço para a criatividade do  educador e para a expressão das características dos alunos. A eficácia do  método era atestada pela qualidade dos alunos que freqüentavam a escola  pública.
Agora, a ênfase saiu do professor e  passou ao aluno. O estudante tem espaço para a sua manifestação e suas  exigências estão cada vez mais presentes. O professor não é mais um  profissional de respeito, mas precisa aprimorar suas atividades didáticas para  conquistar o respeito de seus alunos. Apesar da consciência renovada que temos  hoje sobre a educação, progressivamente, nos últimos anos, a qualidade de  ensino caiu, as condições de trabalho se tornaram piores e os professores menos  preparados. As condições sociais mudaram, o consumo passou a ser um valor social  em detrimento do  valor individual. O  sujeito passou do que “é” ao que “consome” e sua capacidade de consumo está  diretamente relacionada ao status que atinge em sociedade. Ao mesmo  tempo, a violência cresceu e as autoridades apenas têm assistido ao fenômeno,  sem a capacidade ou a vontade política suficiente para reverter o grave quadro  que se apresenta.
A sala de aula, um microcosmo dos  valores sociais, passou a demonstrar como o valor “respeito” decresceu nos  últimos anos. Não se imagina aqui que haja a possibilidade para o retorno do  professor como figura autoritária e dona do saber. Entretanto, alguns episódios  que vêm sendo registrados pelos noticiários, como professores sendo agredidos  no exercício de sua profissão, demonstram não ser possível que se mantenham as  atuais condições de trabalho para os educadores. É imprescindível que a  sociedade volte a discutir valores não como uma forma de dominação de um  indíviduo sobre o outro, mas para que o respeito tanto de professores por seus  alunos quanto de estudantes por seus mestres seja novamente uma condição para  que a aprendizagem possa fluir naturalmente. 
                                                                        
                                                                          Profª. Dra. Mônica Éboli De Nigris
 Dpto. Lingüística pela USP 
                                                                            monicaeboli@hotmail.com