ALEGRIA NA BOCA
Estômato, de origem grega, (stoma, stomatos) é boca; assim como Gnato, também do grego (gnathos) é maxilar. O conjunto da boca com seus dentes, tecidos de suporte periodontal e de revestimento, gengivais, maxilares, ligamentos, músculos e articulação temporomandibular, constituem o sistema estomatognático, ou sistema mastigatório.
Este sistema começa a se desenvolver no humano, já na segunda semana de vida intrauterina, com o esboço da membrana bucofaringeana, que formará a boca. Os ossos que formarão os maxilares e suas articulações são esboçados já na quarta semana, e dos 28 dias até os 40 dias de gestação, a face do embrião já estará esboçada, com tecidos de revestimento e músculos que os sustentarão e que movimentará a mandíbula, o único osso móvel da face. Os germes dos dentes descíduos, “de leite”, só começam a ser iniciados a partir da oitava semana, e nós nascemos sem dentes. Só após a erupção dos vinte dentes da primeira dentição, as dimensões da face se estabelecem, verticalmente, com a dimensão oclusal (com boca fechada e dentes em contato); dimensão de repouso (com 2 a 6 milímetros de separação entre os dentes); e dimensão fonética, estabelecida pelo espaço entre os dentes para pronunciar as letras sibilantes como “s” ou “x”, e as letras abertas como “m”, “f” ou “w”.
Com o correr dos anos, perdem-se os dentes de leite, e aos cinco anos aparecem os primeiros molares permanentes, que manterão essas dimensões da face, com o equilíbrio do crescimento facial, e com o estabelecimento posicional esqueletal e funcional dos dentes e da mandíbula. A mandíbula, muito móvel, com possibilidade de movimento para frente e para trás; para baixo e para cima; para o lado direito ou esquerdo, só saberá o seu lugar de trabalho ou repouso guiado pelos dentes anteriores, que com seus movimentos guiados remodelarão as cavidades articulares temporomandibulares. Por isso, a Santa Natureza nos colocou na boca, após os primeiros molares permanentes, os dentes anteriores, para aprendermos a guiar a mandíbula em todos os seus movimentos e posições; porém, quando perdem-se os dentes anteriores, quando se criam maus hábitos orais de chupar os dedos, chupetas, lápis, canetas, que deslocarão esses dentes de suas verdadeiras posições, ou por problemas genéticos aparecerem incompatibilidades de tamanho de arco ósseo e posição dos dentes, de modo a acontecerem problemas de desarmonia dental como o dentuço ou o queixudo, a mandíbula pode perder a sua guia anterior de movimentos, a sua posição vertical e horizontal, e o desequilíbrio em todo o sistema acontece.
Quando se perdem os dentes posteriores e a dimensão vertical é alterada, o mesmo desequilíbrio aparece. Também quando se reconstrói um dente ou vários dentes com restaurações fora da real dimensão vertical, e de oclusão funcional, ou então, por estresse, o indivíduo rói os dentes (bruxismo) com tal fúria diurna ou noturna, que gastando os dentes altera essa dimensão vertical e a posição correta funcional dos dentes e da mandíbula, o desequilíbrio acontece, geralmente acompanhado de sintomas desagradáveis. Primeiramente, alterando a fisionomia pela perda da dimensão vertical facial e alteração posicional da mandíbula, pela contrição ou lassidão dos músculos faciais; “segundamente”, pelo desconforto ao mastigar, com dores a nível muscular ou tempormandibular; e “terceiramente”, por possíveis ruídos ou estalos desagradáveis a nível das articulações temporomandibulares. As dores musculares irradiam-se das têmporas até a porção superior do crânio, descendo pelo pescoço, envolvendo todos os músculos mastigadores: masseter, temporal, pterigóideo medial e pterigoideo lateral, afetando também o externo-cleido-mastóideo, pela inserção posterior do temporal. É a síndrome de dor e disfunção craniofacial bem característica, bem diferente das dores de cabeça ou enxaquecas.
E como se perdem dentes, por ignorância, descuido, má higiene ou pobreza, a Santa Natureza fabricou o esmalte, tecido de fosfato de cálcio, a hidroxiapatita, para revestir as coroas dos nossos dentes, com uma dureza tal (300 brinel), que podem mastigar, funcionalmente, durante 70 anos com sucesso. Mas a má alimentação, a má higiene e as bactérias, podem estragar toda uma boca, cariando os dentes, inflamando as gengivas, o periodonto e o osso alveolar, quebrando ou derrubando dentes. Tudo isso leva à perda da alegria na boca, porque a boca começa a sofrer.
Mas, observe que a nossa Vida começa na boca: quando nascemos, logo choramos pela boca para iniciar a respiração; mamamos com a boca para sobreviver; aprendemos a mastigar com os dentes da boca para mudarmos o tipo de nossa alimentação e crescermos; aprendemos a falar, a cantar e a assobiar com a boca, para interagir na sociedade dos homens que pensam, criam, memorizam e expressam com palavras e sons aquilo que pensam e sentem; e com a boca sorrimos, acarinhamos ou beijamos tudo que nos é amado.
Aprender a valorizar a boca é sinal de qualidade de vida. Como é triste ver a boca do povo: sem dente ou dentes, com próteses desajustadas ou mal construídas, com gengivas inchadas, inflamadas, com mau hálito, bocas murchas, rostos enrugados e fisionomia alterada pela perda do equilíbrio craniofacial.
Amemo-nos, profundamente, a começar pela nossa boca. Examine-a, diariamente, pelo espelho, limpando-a cuidadosamente dos restos alimentares, das bactérias ou das palavras torpes que não a enobrecem. Não são os nossos olhos que são o único espelho de nossa alma, como diz o dito popular, mas também nossa boca, pois, olhando-a, pode-se dizer se nos amamos realmente; se somos cuidadosos com a nossa saúde e com a nossa imagem, se somos limpinhos e cheirosos; se estamos zangados e com vontade de praguejar; ou alegres, felizes e prazerosos com a Vida que Deus nos dá.
Dr. Silas da Cunha Ribeiro
Professor Livre-Docente - USP
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