Envelhecimento e saúde
A expectativa de vida aumentou no País. Todavia os cabelos brancos e rugas não se encaixam no padrão estético da sociedade brasileira. Somos um dos maiores mercados consumidores de tinturas para cabelo, cirurgias plásticas e cosméticos "antiidade". A obsessão de alguns idosos em apagar as marcas que a vida lhes imprime leva-os a ficarem tão esticados e coloridos artificialmente que se tornam irreconhecíveis.
Além disso, ter idade no Brasil é quase sinônimo de ser pobre. Grande parte dos maiores de 60 anos recebe aposentadoria de apenas um salário mínimo. Essa renda é usada não apenas na sobrevivência do idoso, mas também na ajuda a filhos e netos. Em várias pequenas cidades são os idosos que sustentam a economia local. Só há movimento no comércio e setor de serviços nos dias de pagamento das aposentadorias do INSS.
Outro dado preocupante vem de uma pesquisa realizada na UNIFESP. Cerca de 24% dos idosos de Brasília, Porto Alegre e São Paulo, usam medicamentos psicotrópicos - calmantes, soníferos, etc. -, os quais podem causar dependência química e predispor a quedas e acidentes na direção de veículos.
A possível explicação para esse fato é o aumento da ocorrência de depressão e ansiedade. Ao contrário da cultura oriental, na qual a família reverencia os membros mais velhos, o costume ocidental induz os idosos a "sofrerem dos nervos" pelas circunstâncias familiares adversas que enfrentam.
Vários idosos queixam-se de que, cada vez mais, a responsabilidade de cuidar dos netos é transferida pelos pais aos avós. Assim, as atividades da casa giram em torno dos horários de escola, cursos e refeições dos netos, e não da livre vontade dos idosos.
A alta taxa de desemprego também leva muitos filhos adultos a morar novamente com os pais. Porém nem sempre o convívio entre as gerações é harmonioso. Na crise de relacionamento entre pessoas com idades e idéias tão diferentes, os mais velhos tendem a ser os mais prejudicados. Casos extremos resultam em episódios de violência doméstica contra os idosos.
Vários idosos olham para trás e vêem o conforto material e o sucesso na educação dos filhos, mas sentem-se infelizes pelo fracasso no casamento.
Quando buscam a compreensão e o carinho do cônjuge, sentem-se sós.
Entretanto o divórcio, as novas relações afetivas e o sexo, na terceira idade, são vistos com desconfiança, até pelos próprios familiares. Lamentavelmente, nossa sociedade tende a encarar o namoro do idoso como sem-vergonhice mesmo.
Certamente a questão do papel do idoso na família e na sociedade brasileira ainda levará anos - talvez gerações - para ser solucionada. Porém é preciso que os profissionais de saúde fiquem atentos ao idoso e sua família.
Que os muitos e belos anos de vida traduzidos em cabelos brancos nos enterneçam e ajudem a repensar o envelhecimento. Façam-nos ver os muitos ambulantes e sem-teto de cabelos grisalhos como pessoas com nome, sobrenome e uma história para contar. Sirvam de estímulo para que cada um de nós busque hoje a saúde dos anos futuros, numa sociedade mais justa e humana para os indivíduos de todas as idades.
Profª Dra. Aracy P. S. Balbani
Otorrinolaringologista e pesquisadora
UNESP, Botucatu
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