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Na Busca por Palavras Conservamos nossa Memória


Nícia Tavares
O Caça-Palavras do Jornal Maturidades da UAM, PUC-SP é realizado por nossa colega de equipe Albanita de Paiva, que já alcança um número incontável de leitores, dando-lhes a oportunidade de se distrair no decorrer das atribulações do seu dia-a-dia.

Albanita tem uma determinação incansável: não só elabora a grade, mas também explicita o significado, dentro de um conjunto de informações relacionadas a um tema. É um trabalho feito com muita dedicação e carinho que tem como resultado caça-palavras muito bem estruturados, fruto de uma excelente pesquisa cultural.

Os temas abordados na construção do Caça-Palavras são sempre de interesse geral e abrangentes, dando aos aficionados a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre diversos assuntos: “Grandes Pintores do Impressionismo”, “Museus e Espaços Culturais da Cidade de São Paulo”, “Siglas nossas de cada dia”, “Mitologia”, “Provérbios”, e muito mais.

Como reconhecimento e valorização do trabalho de Albanita e fugindo um pouco à regra das nossas entrevistas, fomos falar com a psicóloga Nícia Tavares que nos esclareceu a importância do Caça-Palavras para a preservação da memória do ser humano.

Jornal Maturidades – A realização de um caça-palavras atua em que região do cérebro?
Nícia Tavares – Um fisiologista poderia dar mais detalhes nessa resposta. Tem várias partes que compõem o cérebro. O caça-palavras atua em todo o córtex e a principal atuação dele é na memória. A memória de curto prazo vai ser fundamental no exercício com o caça-palavras, porque ela serve para alimentar a nova realidade.

Maturidades – Para que serve a memória de curto prazo?
Nícia – Se não tivesse a memória de curto prazo, por exemplo, nós não estaríamos aqui fazendo essas coisas. Quando falamos de memória temos a impressão de coisas que temos que recordar, mas além delas tem também a que estou vivendo aqui e agora, saindo da memória de longo prazo para a de curto prazo. Uma é operacional e a outra é a que conhecemos mais como memória, das recordações, das emoções. É assim que o nosso cérebro funciona.

Maturidades – Qual a relação entre memória de longo e curto prazo e caça-palavras?
Nícia – A maior parte das doenças neurodegenerativas vai influenciar no funcionamento da memória, quando a pessoa não sabe mais quem ela é e o que está fazendo. Então, o caça-palavras vai dar ênfase nas áreas de broca e vernuique que são as áreas justamente da fala, porque uma coisa é eu falar para você, outra é você saber escrever o que eu estou falando e outra é o símbolo disso. Por exemplo, eu falo para você “hã hã” ou você me fala um negócio e eu respondo “hã hã”. Você já sabe que tem uma diferença aí, porque uma hora eu estou sendo irônica. Essas áreas trabalham juntas para poder distinguir não só a palavra. Então, a palavra escrita, o seu significado, a interpretação e a cultura que o texto vai trazer... tudo isso virá através do caça-palavras.

“Tem uma neurologista que teve uma experiência com palavras cruzadas e percebeu que o caça-palavras é melhor do que as palavras cruzadas, porque com ele há uma informação e para o cérebro funcionar adequadamente é fundamental que haja também informações novas. Se fosse só a palavra cruzada, você não tem o contexto que vai propiciar, por exemplo, uma conversa com alguém: “Ah, olha não sabia que Platão fazia isso e aquilo”. O caça-palavras vem junto com um contexto, e tudo que você precisa do ponto de vista fisiológico para decifrar aquilo está atuando diretamente no córtex”.

Maturidades – É importante exercitar o nosso cérebro?
Nícia – Quanto mais exercitar, melhor. E isso não significa que não vamos demenciar, envelhecer, adquirir algum tipo de doença neurodegenerativa. Porém, os pesquisadores dizem que lentifica o processo. Lentificar é uma palavra utilizada no meio científico. Existe na psiquiatria, uma lentificação. Então, se a pessoa já tem, já começou um Alzheimer, um Parkinson, alguma patologia, ela tem a possibilidade de ir lentificando isso conforme ela vai utilizando o cérebro. Mas não podemos nos enganar, pois o cérebro é igualzinho às outras partes do corpo, e, portanto, envelhece igual. Só que, quanto mais ativo, menos problema ele vai dar. Portanto, quanto mais cultura a pessoa adquirir, seja através de leituras ou conversas, será melhor. Quanto mais interagir com outras pessoas, melhor será para todas as funções do cérebro.

Maturidades – Quais os benefícios que o caça-palavras proporciona?
Nícia – A pessoa vai, de alguma forma, desenvolver uma estratégia. Ou ela procura o “L” do início, ou ela procura o “S” do meio, ou ela tem uma sequência para achar as palavras. Por ela ter essa sequência, tem que desenvolver um planejamento estratégico que também vai auxiliar no dia-a-dia: “O que eu vou fazer primeiro? Eu limpo a casa de cima para baixo ou de trás para frente? Começo pelo quintal?” Para caçar palavras é preciso um planejamento estratégico. Começa uma hora aqui, outra ali. É nesse planejamento estratégico que ela começa a se disciplinar e vai ter que por sua atenção. É maravilhoso o resultado. Tem quem não consegue, mas quando se concentra para poder fazer a atividade, já está desenvolvendo o planejamento e quando inicia, vai desenvolver uma série de outras situações, por exemplo: tolerância e frustração. Afinal, ela pode não achar a palavra, mas ela precisa aumentar a paciência, controlar a irritação e a raiva e com a prática vai adquirir maior versatilidade, um aumento do conteúdo cultural e ter um momento de solitude, que não é um momento de solidão.

Maturidades – O que é ter um momento de solitude?
Nícia – É interessante e todo mundo precisa desse momento de solitude. Estar consigo mesmo, não numa lamúria, numa ausência, num buraco, lacuna ou falta, mas estar consigo mesmo numa proposta, num propósito legal. O final de todos nós é estarmos sós, viemos sozinhos e vamos sozinhos. E, às vezes, também para o idoso, o excesso de burburinhos cansa. Então, é o momento da pessoa estar sozinha com ela mesma, num recolhimento. E não é um momento triste, mas sim de trabalho, pesquisa e busca. Um momento onde ela está funcionando. É estar consigo, concentrada em suas situações e quando consegue, no caso do caça-palavras, achar uma palavra, vem a sensação de vitória e poder.

Maturidades – Para você qual a principal perda do idoso?
Nícia – A pior coisa é a perda de poder. Todos os tipos de poder. Se aos 40 anos você pensava em fazer uma viagem para a Grécia, enquanto aposentado você já pensa duas vezes: “Será que o dinheiro não vai fazer falta amanhã?”. Aquela coisa de interagir com essa situação muda completamente. E muda também o poder que tinha sobre a família, os filhos e um sobre o outro. A autoestima diminui.

Então, a partir do momento em que você faz um caça-palavras e percebe seu potencial, seu poder, não importa que os outros não acreditem que você o tenha, mas você se percebe como tendo. Nesse momento, esta satisfação vai conduzir inclusive à autoimunidade. Temos deficiência imunológica quando nos deprimimos. E, também na depressão, quanto mais satisfação você tiver consigo mesmo e perceber que você pode, ver que é capaz de fazer todo um caça-palavras, terá maior satisfação interna, melhora na sua resistência e seus momentos depressivos [que o idoso tem mais, por conta das despesas, das perdas...].

Não é a velhice que trás a depressão. Se a pessoa tiver idade e poder... Por isso, nunca aconselho alguém a se aposentar, porque enquanto há planejamentos de vida, a pessoa se sente apta e daí nem sente dor nem tem depressão... Agora, quando se sente inapta, tudo começa a aparecer.

Então, o caça-palavras também é uma das atividades que auxiliam a pessoa a ficar feliz. Os neurologistas dizem que precisamos ter atividades sociais e físicas. Então, existe um recurso muito rico dentro do caça-palavras, não é o único, mas é bem abrangente. Ele propicia quase todas as atividades que uma pessoa precisa ter, menos a física.

“A velhice tem duas situações: muitos ganhos e muitas perdas. Percebemos os ganhos quando não estamos doentes: aquisição de uma maior tolerância, versatilidade, paciência, ter sabedoria dos anos que a vida colocou, viver coisas que ninguém nunca viveu. Mas, de outro lado, existem as perdas: não se tem mais o corpo que tinha, talvez não seja mais tão desejada pelo seu marido como antes, ou nem tenha mais uma relação afetiva, porque os maridos envelhecem também... É um outro momento de vida. É preciso aprender a viver aquele momento de uma maneira mais agradável, sem questionamento, porque não adianta, você precisa de lente, de aparelho auditivo e vai andar mais lentamente”.

Maturidades – O caça-palavras deve ser estimulado para qualquer idade?
Nícia – Deve. A ênfase é dada para a Terceira Idade, mas não significa que não seja bom para as outras fases. Para qualquer pessoa, tanto o caça-palavras quanto as palavras cruzadas são importantes. Até para criança pequena, que está recém-aprendendo.

Maturidades – É mais importante para o idoso?
Nícia – Sim, por conta da perda da memória e da coincidência dessas doenças neurodegenerativas. A todo momento a criança adquire conhecimento e informação, já o idoso não está nessa fase de tantas aquisições e desenvolvimento. Isso justifica os médicos estarem indicando, hoje em dia, esse tipo de atividade para os idosos. Não tem nenhum trabalho específico para dizer a quantidade de benefícios que isso traz, por isso os médicos dizem “lentifica”, mas como se sabe qual a atuação de cada área do cérebro, por lógica, se chega a essa conclusão.

Maturidades – O caça-palavras entra como um desafio para o idoso e isso é interessante?
Nícia – É maravilhoso o desafio de chegar e conseguir encontrar todas as palavras. Começa com uma curiosidade e quando não se acha o que se procura, é preciso se superar e, assim, você vai ficando cada vez mais expert no assunto. É uma conquista, um universo novo, diferente, não é de dominância de todos, mas só de alguns. É como quem nunca nadou e de repente aprende a nadar, a dominar aquele universo da água. É como quem nunca leu uma partitura e passa a entender o que está escrito na pauta. Quanto mais faz, mais domina e mais gosta.

A preocupação atual, em geral, é de estímulos físicos, bailinhos e atividades sociais. Existem pesquisas em relação à parte física, ao trabalho cardiovascular, mas não ao trabalho cerebral. E, na verdade, quem comanda quem? As possibilidades vem pelo cérebro, o corpo se movimenta pela ordem do cérebro. É um conjunto, não dá para separar o lado B. O meu corpo carrega tudo que eu penso e eu penso aquilo que o meu corpo manifesta. É uma união feroz, não tem como separar.

A atividade física é superimportante. E o caça-palavras é uma atividade física para o cérebro, porque de alguma forma ele está pensando e é assim que ele se exercita.

Maturidades – Quando o jornal era impresso, a Albanita relatou que alguns leitores a contatavam para perguntar como terminar o caça-palavras que ela tinha construído e, por conta disso, ela montou um esquema para facilitar a localização das palavras.
Nícia – Fazendo tudo isso, a Albanita está lentificando, também, o tempo que ela gasta. Ela está fazendo e construindo. E o prazer dela e o efeito psicológico nela são muito maiores do que nas outras pessoas, porque a gente está se referindo a um idoso que está lá em um momento de realização. Então, é uma outra visão. O tempo em que Albanita se detém para fazer esta atividade é muito maior do que o tempo que a atividade pronta vai ser consumida pelo leitor. Ela tem, inclusive, que utilizar a seleção, o bom senso, coisas que a pessoa que está procurando não precisa utilizar, pois não precisa ter um juízo de valor assim tão aprofundado. Então, ela exercita ainda mais áreas do cérebro quando ela faz essa atividade, e por mais tempo. Do ponto de vista dela, Albanita, fazendo, tem tudo de bom e positivo. Tem também a parte emocional que ajuda bastante. Cada vez que ela recebe o benefício de uma alegria, ela está fazendo um pouquinho a mais de anticorpos. É fundamental sentir felicidade e alegria, é o oposto da morte.

Maturidades – Nícia, qual sua mensagem para os nossos leitores?
Nícia – Muita coisa é falada em relação à vida da Terceira Idade, mas o que precisamos é ter orgulho e satisfação de ser quem somos, na idade em que estivermos, arrastando o que tivermos que arrastar. Representamos o troféu da vitória que foi termos vivido tudo isso, e quando buscamos muito dissimular quem fomos – com plásticas [não aceitação da idade], tudo isso vai dificultar para sermos quem fomos, somos e seremos. A cada dia podemos ser uma pessoa melhor e ter maiores aquisições, mas o fundamental é ter o desejo de viver. Tenho um amigo, médico, que fala uma coisa que eu acho interessantíssima, que na sapiência e na idade dele, nunca viu uma pessoa com desejo de morrer. “Sempre, as pessoas só morrem quando elas perdem o desejo de viver”. Então, tudo o que for de vida que se faça, porque já que estamos vivos vamos ter qualidade e procurar os momentos de crescimento, de interação, de viver, sendo você mesmo, com a melhor qualidade possível, sem vergonha de ser o que é. Ao contrário, com orgulho de ser quem é. A idade tem que produzir orgulho em nós e a mídia às vezes envergonha.
Nos anos 70 tinha tanto jovem que a cultura que se tinha era da beleza, do corpo escultural. Hoje já não temos mais tantos jovens e isso é uma realidade mundial. Temos muito mais pessoas de idade, que vão ficando cada vez com mais idade por causa de todos os favorecimentos para isso. E parece que fica vergonhoso ser velho, porque tem que estar sempre com aquele corpo e, então, vemos pessoas desesperadas para não aparentar a idade. Mas, desse jeito, onde vamos parar?

Célia Gennari
celia-gennari@uol.com.br

Ignez Ribeiro
ignisignis@uol.com.br

Fotos:
Célia Gennari

 
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