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CHIESA: BRILHO NOS OLHOS DE QUEM FAZ O QUE GOSTA


Maria Auxiliadora Chiesa, 70, presença forte e marcante. Recebeu-nos com tranqüilidade e simpatia, e nos deixou completamente à vontade. O olhar é perscrutador e atento. A palavra calma, cheia de emoção, domina o ambiente. Célia e eu, agradavelmente envolvidas, não sentimos o tempo passar...

Chiesa, desde muito jovem, sentia uma verdadeira paixão pelo teatro. Seu pai, mesmo tendo poucos recursos, era culto, educado e intelectual, e soube dar-lhe condições para estudar, não poupando sacrifícios para isso. Aos 12 anos de idade ela teve oportunidade de estudar inglês e sua professora, Miss Meg, deu-lhe um livro de Shakespeare, que foi lido no original. Paixão à primeira vista. Descortinou-se um mundo à sua frente. Algum tempo depois, descobriu um baú no porão da casa de sua avó, o qual ela havia trazido da Espanha, e dentro dele, a menina sonhadora vislumbrou entre trapos, roupas, chapéus e leques a oportunidade de viver e interpretar os personagens do seu amado Shakespeare. Assim nascia uma atriz!

A vida seguia seu caminho, e ela cursou Psicologia-USP, História da Arte-USP e mais de seis cursos de Teatro. Mas ser artista, naquela época, era um problema muito sério, tinha uma conotação muito pejorativa. Ter cultura, sim. Atuar, não!

Chiesa casou-se cedo, aos 19 anos. Seu marido engenheiro, muito objetivo, racional, tem os pés muito bem plantados no chão, e ela, só emoção, caminha nas estrelas: “...é difícil viver comigo, sou uma sonhadora, acho que meu marido é um santo”, comentou. Adaptações, ajustes e muita compreensão fizeram com que usufruíssem uma vida a dois muito construtiva, e já comemoraram Bodas de Ouro, com três filhos: Marcos, Rodrigo, Silvia e um netinho a caminho...

Aos 39 anos de idade, ela teve a oportunidade de levar uma peça de teatro, no colégio onde os filhos estudavam e o resultado foi tão bom que as mães dos alunos queriam mais, incentivando-a a continuar. Foi o começo de uma longa jornada. A sua paixão pelo teatro rompeu barreiras e aflorou com toda a intensidade.

Chiesa tem um estúdio em casa onde ministra Cursos de Teatro e de Orientação Teatral. Criou grupos de teatro em uma comunidade e com isto ajudou a tirar muitas crianças da rua e das drogas, um trabalho voluntário, ao longo de muito tempo, que lhe angariou a gratidão das mães e familiares. Atua, agora, para a Polícia Militar do Estado de São Paulo, com seu “Grupo Anima de Teatro”, todos os fins de semana sem interrupção, com um texto que dramatiza a vida dos policiais e valoriza sua atuação junto à sociedade, ao mostrar todas as dificuldades profissionais, familiares e sociais. Este trabalho do “Grupo Anima de Teatro” é remunerado e se apresenta na capital e no interior, há mais de seis anos.

Aluna da UAM-PUC/SP desde 2004, já mostrou sua arte por três vezes nos “Saraus Litero-Musicais”, na Livraria Cortez, organizados pela Equipe do Jornal Maturidades, o que despertou nos alunos um grande interesse por um Curso de Teatro. Ela, para quem o “teatro é arte viva”, disponibilizou-se a dar um curso, extracurricular, para alunos interessados, como voluntária, precisando para isso de um espaço adequado e amplo.

Os coordenadores da UAM, Profs. Antônio Jordão Netto e Fauze Saadi, com muito empenho, abriram espaço no curso regular para aulas de Teatro, convidando Chiesa para ministrá-las. É pena que não haja disponibilidade de um espaço maior que viabilize melhor as aulas práticas, e que dê oportunidade para mais pessoas que estejam interessadas, até mesmo para criar um Grupo de Teatro da UAM-PUC/SP.

Teatro é teoria, é prática, é ação. As pessoas precisam se expor, vivenciar seus personagens. “É uma tríade: ator, texto e público”, explica Chiesa. Para ela que, em cada espetáculo, deixa uma pouco da alma, do coração, muitas lágrimas derramadas e suas rugas expostas, o teatro é uma arte que alia a técnica ao talento, e mesmo que seja um drama, tem que ter sempre uma mensagem positiva. Para as pessoas de mais idade, a arte de representar é “a maturidade da maturidade”, há rejuvenescimento interior, no reviver papéis e momentos... Em síntese, é a “liberdade, é vida que vence!”

“Nascer todos os dias e dar à luz personagens além de Macbeth, além de Antígona, além de si mesmo, resgatar, à força da própria unha, a alma das palavras... O teatro não deve ser terapia, ele ajuda a viver melhor... é arte viva... Que ele cumpra o seu papel de alerta e que a arte alimente o espírito dos homens”, deseja Chiesa.

Nota: Há cinco anos Chiesa sofreu uma queda, na escada de sua casa, que acarretou múltiplas fraturas em uma das pernas. Levou um ano para se recuperar. Chorou muito, parou, refletiu e voltou com força total. Está viva para continuar a mostrar o que aprendeu com seus grandes mestres, e o faz com muita alegria e prazer.

 

Ignez Ribeiro
ignisignis@uol.com.br
Célia Gennari
celia-gennari@uol.com.br
 
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