O Relicário
Por GLuciano Percussi (2004)
Tradução por Maria Grazia Percussi e Betty Jona
- Vó, o que é que você está fazendo, tão quietinha! Tão suspirosa! Quando você começa a suspirar... hum... tenho até medo.
- Vó, outra vez com esse álbum no colo? Outra vez esse olhar saudoso, essas rugas acentuadas, essas mãozinhas trêmulas, esse choro reprimido?
- Vó, não chore não, lembre com saudades, mas... não com lágrimas. Tudo passa na vida. O ontem ficou no passado, lá longe. O que vale vó, é o hoje. E hoje está um belo dia! Dá até para sair um pouco, passear pela rua, conversar com as vizinhas, olhar os cachorros passeando com seus donos, olhar a vida, vó! A vida! Deixa que eu empurre sua cadeira. Vamos lá, vozinha querida... O sol está quentinho! Vamos lá...
E lá se vão as duas, pelas ruas de um bairro antigo, de uma cidade interiorana, onde o passado se perpetua nas fachadas de casas simples, onde o silêncio só é interrompido pelo latido de cães caseiros ou pelo canto de pássaros soltos nas árvores, onde a paz pode até ser melancólica, porque saudosa...
E o álbum, onde ficou o álbum cuja capa de couro perdeu sua cor original? O álbum relicário, que guarda fotos antigas, de tempos que não voltam mais, tempos felizes, simples, ausências daqueles que já se foram. Memórias vinculando o passado ao presente, unindo o ontem ao hoje, estampando a transformação, fruto de um tempo que passa... passa...
Ao olhar as fotos a vovó saudosa chora, porque constata que o tempo não para, tudo se transforma e só as fotografias são capazes de conter o antes e o depois.
E na sabedoria de idosa cuja memória já está se diluindo, ela usa seu amado relicário para recordar, porque não quer castigar o seu passado com o esquecimento daqueles a quem tanto amou!
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