O Bolinho com sotaque francês
2009, Ano da França no Brasil, da pátria de Napoleão, Sartre e Sarkozy: uma série de eventos percorrerá o nosso país até novembro.
Entre muitos quitutes com sotaque francês, um faz muito sucesso aqui no Brasil: é o bolinho Madeleine ou petite Madeleine, à base de farinha de trigo, manteiga, ovos, açúcar, aromatizado com casca de limão ou água de flor de laranjeira. Superfície estriada com formato de concha de Vieira, agrada nossos olhos e também o nosso paladar. A única dificuldade com relação à Madeleine é encontrar as forminhas especiais em que elas são assadas no forno convencional. Por seu sabor delicado, é ideal para lanches, principalmente acompanhando chá ou café.
Atribui-se a invenção da delícia a uma mulher chamada Madeleine, que usava os bolinhos para alimentar os peregrinos do Caminho de Santiago. Esta rota atravessa o norte da Espanha, a partir da fronteira com a França, em direção a Santiago de Compostela, capital da Galícia, província da Corunha, cujo símbolo é uma concha de Vieira.
O nome de Santiago de Compostela compõe-se de duas partes: São Tiago, um dos doze apóstolos de Cristo e Compostela, Campus stellae, que quer dizer “Campos de Estrelas”. Este Campo de Estrelas refere-se à lenda que deu origem à cidade. Em 813, um habitante de nome Pelayo estava no local quando viu luzes e sinais no céu. Ao segui-las, encontrou o túmulo e os restos mortais de São Tiago e discípulos. Relatou o ocorrido ao Bispo Teodomiro, que informou ao Rei Alfonso ll. O rei, chegando ao local, ordenou a construção da primeira capela para proteção do apóstolo e para que o recordassem. Assim, a cidade foi sendo edificada e hoje a catedral de Santiago de Compostela, mundialmente famosa por sua fachada barroca, é um ícone de peregrinação cristã.
Mesma personagem, porém roteiro diferente: em 1755, o confeiteiro titular faltou ao serviço. Uma jovem empregada da marquesa Perrotin de Baumont preparou a receita da avó para um banquete em homenagem a Stanislas Leszczynski, soberano deposto da Polônia, sogro de Luis XV, rei da França. O ex-rei adorou os bolinhos e quis conhecer a autora da divina inspiração. Perguntou seu nome. Madeleine, ela respondeu. Onde nascera? Em Commercy. Como o bolinho não tinha nome, ele o batizou de Madeleine de Commercy, e a receita permaneceu secreta até a morte do duque.
Segundo o historiador Charles Dumont, as Madeleines só começaram a fazer sucesso na França no século XIX, com a inauguração da estrada de ferro por Napoleão III, em 1832. Quando o trem parava na localidade de Commercy, perto de Meuse, na região de Lorena, nordeste da França, vendedoras ambulantes na estação ofereciam o quitute, gritando o nome da especialidade e de seu produtor.
Era o mais famoso show da ferrovia francesa, pois os passageiros se divertiam com o assédio e com o pouco tempo que tinham para negociar os bolinhos rechonchudos. O show perdeu a graça com a deflagração da 2ª Guerra Mundial, em 1939.
Na história da especialidade, quem a eternizou para o mundo foi o escritor francês Marcel Proust (1871-1922). No Caminho de Swann, primeiro dos sete volumes da obra-prima Em Busca do Tempo Perdido (publicado entre 1913 e 1927), ele relata como foi apresentada a iguaria e revela o efeito que ela teve em sua vida e arte.
Num dia de inverno, chegando em casa, com frio, a mãe lhe deu o bolinho acompanhado de uma chávena de chá. Ao levar um pedaço à boca, amolecido pela bebida, veio à sua mente, não apenas a lembrança do passado, mas também a sensação de voltar à infância. Madeleine tinha o mesmo sabor daquele que a tia Leonine lhe oferecia, todo domingo de manhã, anos atrás. O paladar revivido é uma experiência, porém, pode também ser considerada a vitória da memória sobre o tempo.
Apesar da tardia menção dos bolinhos Madeleine, foi Proust que os imortalizou.
Sueli Carrasco
sueli.carrasco@uol.com.br
Fontes:
LOPES Dias. Bolinho que Prost Imortalizou
Disponível em: www.históriadaalimentação/ufpr.br/noticias
Acessado: 14/02/2009
www.Santiago-de-compostela.costasur.com/historia.htm
Acessado: 12/07/2009
http://pt.wikipedia.org/wik/Santiagodecompostela
Acessado: 15/07/2009