1968
Por Sueli Carrasco
Não se esqueçam de que era o ano de 1968, época de costumes completamente diferentes dos atuais. Estávamos comprometidos há seis anos, já tínhamos nos graduado e queríamos ter a nossa própria casa, sentíamos essa necessidade.
Entretanto, eu tinha um obstáculo a saltar: o meu pai estava doente já há alguns anos e não sabia como desprender-me de minha casa e deixar a minha mãe sozinha para cuidar dele. Sua doença era grave e os médicos haviam alertado sobre o risco iminente de morte.
Meus pais eram ícones para mim, pois sabíamos - eu e minha irmã - que éramos as principais motivações de suas vidas. Em minha mente doída parecia que eles não conseguiriam viver sozinhos, já que minha irmã estava casada há vários anos.
Era eu que administrava a casa, literalmente falando. Todavia, como a palavra “problema” para mim implica em solução, tive que encontrar uma, que não complicasse a minha saúde mental e não me deixasse com arrependimentos. Trabalhei na minha cabeça que eu iria me casar e não mudar para outro país, que somente iria para outro bairro, o mais próximo possível.
Então me fortaleci com o dito que “o ser humano não vem para esta vida com tempo de validade pré-estabelecido e só o nosso universo é que pode decidi-lo”.
Armei-me de coragem e fui conversar com o meu pai. O que mais me marcou, recordo como se fosse hoje, foi a sua debilidade diante da notícia: as lágrimas escorriam pelo seu rosto, mas com uma tranquilidade inverossímil disse: “Isso faz parte da vida, porque eu fiz o mesmo” e completou: “Eu não vou perder uma filha e sim ganhar um filho”. E o ganhou, mas não por muito tempo.
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