Vera Lucia Simões da Silva: 64 anos nadando
“Acho que já nasci com disposição para o esporte. Minha mãe Alice Hannickel Simões, que foi jogadora de vôlei nos anos 30, foi a minha maior incentivadora. Mas havia também, na família da mamãe, outros desportistas: tia Lourdes, hoje com 90 anos, nadava muito bem, mas não teve muitas chances; tia Dulce, que foi excelente tenista; as primas, Cléa, que foi nadadora e Déa, que participou de campeonatos de tênis, sendo campeã em diversas oportunidades”, contou a nossa Gente Notável desta edição, Vera Lucia Simões da Silva.
A família sempre foi seu esteio. O pai operário, Constantino Simões da Silva Filho, trabalhou muito para não deixar a família passar dificuldades e passou valores que hoje não vemos muito: o respeito, a honestidade, a ética e a moral. “Mamãe, extremamente bondosa para com a família e com os amigos, foi quem sempre me deu muito estímulo para o esporte e para a profissão”.
Ela conta que sua mamãe Alice aprendeu a nadar aos 70 anos e competiu no máster por 22 anos, em Minas Gerais e São Paulo, tendo participado de campeonato mundial no Rio, sul-americano em BH e diversos brasileiros e regionais. Um grande exemplo para muitos.
Foi em Juiz de Fora (MG), onde nasceu, que Vera Lucia teve seu primeiro contato com a natação, aos 2 anos, numa tina de água da bica que corria no quintal. “Era inverno e estava me recuperando de uma doença da época, sarampo. Bem agasalhada fui brincar no quintal e minha mamãe me encontrou feliz da vida dentro da tina de água gelada”, lembrou.
Mas foi aos 8 anos que, de fato, aprendeu a nadar e já aos 9 começou a competir. A menina nadadora também fez balé aquático, jogou vôlei, basquete, handebol, praticou ginástica feminina e jogou até futebol, mas é nadando que ela vive há 64 anos. “Acho que não posso viver sem a natação!”, disse.
No Máster de Natação a nadadora Vera Lucia está desde os anos 80 e coleciona alguns títulos.
Hoje, ela afirma que embora tenha sido campeã estadual de Minas por muitos anos e tenha participado de campeonatos brasileiros com muita satisfação, foi no Máster que se realizou na natação, pois participou do primeiro campeonato mundial no Japão, onde ficou em 3º lugar nos 100 metros de borboleta. “Atualmente tenho diversas vitórias e recordes em campeonatos pan-americano, sul-americano e brasileiro e também no regional da Unami – União da Natação Máster do Interior”.
Em 2011 a atleta ficou entre as 10 melhores nadadoras do mundo, Top Ten da Fina – Fédération Internationale de Natation Amateur, onde se classificou em 8 provas da categoria 70+ (Classificada em 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º e 10º lugares). Em 2012 também ficou entre os 10 mais da Fina, em duas provas (6º e 8º). “Cada uma dessas conquistas me deu grande satisfação em diferentes épocas”, comentou.
Mas foi em 2010 que recebeu o Troféu Melhores do Ano, da Prefeitura Municipal de Rio Claro. “Uma homenagem dessas nos dá sempre um sentimento bom, de realização e de dever cumprido, que é o que espero ter feito durante toda a minha vida pessoal e profissional”, comentou o fato aquela que, também nos anos 60/70, foi considerada a melhor nadadora de Minas Gerais, por três vezes.
Com 72 anos ela continua superando recordes para os quais, segundo ela, não existe receita, apenas um gosto muito grande pela atividade e tê-la tornado um hábito.
Para ela, todos deveriam aderir a alguma forma de atividade física para ter mais saúde, mas infelizmente a prática dessas atividades ainda não é importante na sociedade e a escola não habitua as crianças e os jovens a praticarem exercícios, porque a Educação Física infelizmente não é destaque nos currículos escolares.
Mas não foi nadando que Vera Lúcia “ganhou a vida”. No segundo grau ao realizar o teste vocacional, a primeira opção foi medicina, a segunda assistente social, mas nenhuma delas lhe interessou e, então, sentiu que deveria ir para a área de Educação Física. Foi o que a psicóloga lhe sugeriu, tendo em vista seu interesse pelos esportes e também por ser atleta. Não houve restrição da família. Afinal, Vera Lucia já estava com 24 anos.
A Educação Física veio com a necessidade de formação para continuar trabalhando na natação – sua grande paixão. Nessa época, ela já trabalhava como professora e técnica de natação no Sport Club Juiz de Fora, seu time do coração.
Após a sua formatura passou 30 anos em duas universidades: Federal de Viçosa (UFV) e Estadual Paulista (UNESP).
“Ao terminar o curso em 1972, fui ser técnica esportiva da UFV, para cumprir com a determinação da obrigatoriedade da Educação Física para todos os graus”, contou. Trabalhou nos diversos cursos da universidade, começou um trabalho de extensão para a comunidade, ensinou muitas crianças a nadar e fez uma pequena equipe de natação. Nessa época foi criado o curso de licenciatura em Educação Física e não se sentindo muito segura para formar professores, resolveu sair para a pós-graduação nos Estados Unidos onde fez mestrado e doutorado.
Quando foi nomeada chefe de departamento na UFV, sentiu que a responsabilidade era muito grande, porém já havia passado por uma experiência como vice-presidente da Associação dos Professores da Unesp de Rio Claro, que congregava todos os professores dos departamentos e teve como líder o professor Rubens Vianello que lhe ensinou a atuar como líder e como dirigente.
Tudo na sua vida foi “questão de oportunidade”. Para ela, a sensação ao terminar o doutorado na Universidade Estadual de Michigan foi de completa realização. “Após esta experiência recebi uma ligação da UNESP me convidando para trabalhar, aceitei, fiquei 15 anos e me aposentei por lá em 1999”.
Mas ela teve outras satisfações profissionais, também trabalhou como fotógrafa, deu aula de inglês... e entre as realizações pessoais, ela demonstra que o esporte, mais precisamente a natação, é sua razão de viver.
A oportunidade de dar aula de inglês veio justamente no momento da aposentadoria da universidade. Ela conta que, no primeiro momento quando ainda faltavam alguns anos, sentiu uma espécie de angústia, então decidiu sair de licença prêmio, o que nunca havia aproveitado, e ver como era ficar parada. Mas nesse momento apareceu a oportunidade de dar aula de inglês e resolveu tentar. Deu certo, se aposentou, saiu da universidade, deu aula de inglês, natação, hidroginástica, até que sua mãe ficou doente e ela foi ajudar sua irmã a cuidar dela. “Não trabalhei mais. Hoje quando me perguntam o que estou fazendo, eu digo ‘nado. Só nado’”.
“Sou lutadora, honesta, apaixonada pela vida e realizada. Não costumo olhar para trás e lembrar das coisas ruins. Prefiro me lembrar das coisas boas que a vida me ofereceu. Nunca deixei passar uma oportunidade nem desafio. Se desse certo, tudo bem. Se não desse, partia para outras”.
Profª Drª Atleta Máster Vera Lucia Simões da Silva
Reportagem: Célia Gennari
csgennari@gmail.com
Fotos: Arquivo Pessoal
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